Image hosted by Photobucket.com
15.11.04
 
Cá está o disco ideal para quem só de ouvir a expressão free jazz, alternativa ou cumulativamente, fica com os cabelos em pé, apetece-lhe sacar imediatamente da pistola e fazer fogo sobre o fogo (Fire Music, Archie Shepp), ou mais desesperadamente correr pela ladeira abaixo em busca do primeiro abrigo que lhe salte ao caminho (sugere-se que se tenha todo cuidado, que é sempre pouco, com esta última reacção, pois ela pode reservar-lhe surpresas musicais ainda mais... supreendentes, passe a redundância).
Twice Told Tales (DIW, 2003), coincidência ou não, segue o título da novela de Nathaniel Hawthorne (esse mesmo, o de A Letra Escarlate, traduzido para português pelo nosso ultra citado e infra lido Pessoa), é um miminho de livre-improvisação, despreocupadamente preguiçosa, que chega a fingir que é desconcentrada sem deveras ser, e sem perder a coesão interna. Embora seja tendencialmente verdade que quem vê caras não vê corações (eu próprio sou disso um exemplo eloquente, porque só conhecendo-me se perceberá o quanto o aparentemente inócuo frontispício é assaz enganador), pelas carinhas larocas da fotografia é imediatamente reconhecível estarmos vis-a-vis com quatro rapazes da maior simpatia pessoal e, adivinha-se, empatia musical. Ouvido o disco, assim se confirma o que venho de dizer. Ou não se tratasse de Louie Belogenis (na foto, à esquerda) e Tony Malaby (à direita), dois bravos tenoristas de Nova Iorque, pessoal de uma certa "Downtown", formiguinhas muito activas da Grande Maçã, aqui coadjuvados por Trevor Dunn (do zorniano Electric Masada e do pattoniano Fantomas) nas quatro cordas verticais, e por Ryan Sawyer, nos tambores e pratos. Em boa verdade, não se pode dizer que os rapazes neste disco dêem novos mundos ao Mundo, à maneira dos navegadores de antanho. Mas já se pode dizer com maior propriedade que aprofundam percursos anteriores, revisitam lugares de outrora e contemplam a paisagem futura numa perpectiva simultaneamente de grande angular e de zoom sobre os ínfimos detalhes sonoros. Depois da descoberta, geralmente segue-se o povoamento, e este disco trata disso mesmo: povoa-nos de sonhos nocturnos e retempera-nos as energias para o dia seguinte. Sem ter outros pontos de referência, levei algum tempo a identificar e a caracterizar o som de cada saxofonista, mas penso que consegui lá chegar: Além da qualidade vocal de ambos os timbres, Louie Belogenis soa a madeira seca, talvez um pouco adstringente no final; Tony Malaby é mais macio, espesso e cremoso. Combinam tão bem quanto um bom vinho tinto e um doce à sobremesa. Final feliz.
 


<< Home
jazz, música improvisada, electrónica, new music e tudo à volta

e-mail

eduardovchagas@hotmail.com

arquivo

setembro 2004
outubro 2004
novembro 2004
dezembro 2004
janeiro 2005
fevereiro 2005
março 2005
abril 2005
maio 2005
junho 2005
julho 2005
agosto 2005
setembro 2005
outubro 2005
novembro 2005
dezembro 2005
janeiro 2006
fevereiro 2006
março 2006
abril 2006
maio 2006
junho 2006
julho 2006
agosto 2006
setembro 2006
outubro 2006
novembro 2006
dezembro 2006
janeiro 2007
fevereiro 2007
março 2007
abril 2007
maio 2007
junho 2007
julho 2007
agosto 2007
setembro 2007
outubro 2007
novembro 2007
dezembro 2007
janeiro 2008
fevereiro 2008
março 2008
abril 2008
maio 2008
junho 2008
julho 2008
agosto 2008
setembro 2008
outubro 2008
novembro 2008
dezembro 2008
janeiro 2009
fevereiro 2009
março 2009
abril 2009
maio 2009
junho 2009
julho 2009
agosto 2009
setembro 2009
outubro 2009
novembro 2009
dezembro 2009
janeiro 2010
fevereiro 2010
junho 2011
maio 2012
setembro 2012

previous posts

  • A tarde de ontem rendeu uma excelente entrada na c...
  • Volto a Verbs of Will, disco de 2003 do Mark Helia...
  • Hoje, sábado 13NOV2004, às 22 horas, na Universida...
  • Como é que se pode não gostar deste disco? Johnny ...
  • Sam Rivers, saxofonista, flautista, pianista, ...
  • J. Lima Barreto © Nuno Martins 2003 Jorge Lima Ba...
  • O trio The Flying Luttenbachers, rapazes com um pa...
  • Talvez boa gente não se tivesse dado conta, mas h...
  • Olha que dois... Wynton Marsalis, o putativo guard...
  • Ernesto Diaz-Infante The Abstractions Novo Navig...

  • links

  • Improvisos ao Sul
  • Galeria Zé dos Bois
  • Crí­tica de Música
  • Tomajazz
  • PuroJazz
  • Oro Molido
  • Juan Beat
  • Almocreve das Petas
  • Intervenções Sonoras
  • Da Literatura
  • Hit da Breakz
  • Agenda Electrónica
  • Destination: Out
  • Taran's Free Jazz Hour
  • François Carrier, liens
  • Free Jazz Org
  • La Montaña Rusa
  • Descrita
  • Just Outside
  • BendingCorners
  • metropolis
  • Blentwell
  • artesonoro.org
  • Rui Eduardo Paes
  • Clube Mercado
  • Ayler Records
  • o zurret d'artal
  • Creative Sources Recordings
  • ((flur))
  • Esquilo
  • Insubordinations
  • Sonoridades
  • Test Tube
  • audEo info
  • Sobre Sites / Jazz
  • Blogo no Sapo/Artes & Letras
  • Abrupto
  • Blog do Lenhador
  • JazzLogical
  • O Sítio do Jazz
  • Indústrias Culturais
  • Ricardo.pt
  • Crónicas da Terra
  • Improv Podcasts
  • Creative Commons License
    Powered by Blogger