Image hosted by Photobucket.com
27.11.04
 


Ainda sob os ecos da prestação de Cecil Taylor, Tony Oxley e Bill Dixon no Guimarães Jazz deste ano, a que não assisti e sobre a qual já ouvi e li opiniões muito díspares (para uns, muito bom; para outros, nem tanto) como é bom e saudável que haja, repesco uma opinião há tempos publicada na Tomajazz sobre o concerto de Taylor & Oxley em Fevereiro deste ano, no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa:

"Está há muito esgotada a discussão sobre se o que Cecil Taylor toca é jazz ou música contemporânea. Outra coisa será, porque o que desde há décadas se conhece com a marca do mestre, e, em particular, o que se ouviu no Centro Cultural de Belém, na noite de 17 de Fevereiro de 2004, foi algo que está para além dos limites do jazz, um meta-jazz, se se quiser; mas que, por outro lado, também não se enquadra nos estritos parâmetros da música contemporânea ou da new music. É, diria, um tertium genus inclassificável, pesem embora as tentativas de arrumação nesta ou naquela categoria, tarefa por demais estulta. Cecil Taylor é, quase sempre, referenciado como um músico de Jazz. Este, quer-me parecer, estará para a música de Taylor, como o Latim está para as actuais línguas latinas. Isto é, está-lhe nas fundações, na estrutura, na massa do sangue que lhe circula nas veias, no ritmo interior, na respiração. Pressente-se, mais do que se vê; está-lhe ainda nalgum vocabulário e na articulação expressiva. Porém, na raíz, corpo e espírito, no mais recôndito do ser, do que se trata é de música improvisada total, no que isto tem de reflexo num tempo presente e na mais remota ancestralidade. Foi esta música simultaneamente temporal e intemporal - no duplo sentido em que nela cabe o tempo todo, e que não pertence a tempo nenhum - a que nos foi oferecida em criação directa, imediata e espontânea, por Taylor & Oxley. Uma música tensa e ritualística, música sacra de culturas tribais imaginárias, que tanto podem ser do passado, como do futuro. A execução, organizada em dois sets de tema único, cuja duração me pareceu próxima dos 45 minutos cada (é-me difícil calcular, porque a certa altura perdi a noção do tempo), a que acresceu um breve encore, mostrou-nos dois criadores de comprovado e inquestionável virtuosismo técnico, em excelente forma física e criativa. Taylor fez uso intensivo dos seus inesgotáveis recursos pianísticos, com os característicos clusters de acordes dissonantes, em permanente discurso atonal, fortemente percussivo, que ora ascendia a cumes de intensidade emocionalmente opressiva, ora descomprimia, distendido em breves momentos de contido lirismo poético, libertário e encantatório. Do lado direito do palco, em absoluta compatibilidade, Tony Oxley, ícone do experimentalismo e da free improv britânica, contrapontuava de forma densa e polirrítmica, preenchendo o resto da tela com as cores personalizadas do seu kit. Produziu as mais requintadas sonoridades, dispostas em camadas de ritmo e melodia, plenas de detalhe e riqueza tímbrica e textural, fornecendo a Taylor o ambiente perfeito para sobre ele escrever e rescrever páginas e páginas da mais entusiasmante improvisação livre. A isto acresce a fantástica linguagem corporal do duo, como se os músicos estivessem a dançar um bailado de movimentos livres, uma dança mágica que, desde a noite dos tempos, convoca os espíritos para a celebração da beleza musical em estado puro, patente na magnitude de cada nota, célula e fragmento temporal. Cecil Taylor & Tony Oxley transportam a Música, enquanto arte, a estados superiores de transparência e de transcendência tais que, mais puro que o seu som, só o silêncio absoluto. E esse, sabemos, é impossível".

 


<< Home
jazz, música improvisada, electrónica, new music e tudo à volta

e-mail

eduardovchagas@hotmail.com

arquivo

setembro 2004
outubro 2004
novembro 2004
dezembro 2004
janeiro 2005
fevereiro 2005
março 2005
abril 2005
maio 2005
junho 2005
julho 2005
agosto 2005
setembro 2005
outubro 2005
novembro 2005
dezembro 2005
janeiro 2006
fevereiro 2006
março 2006
abril 2006
maio 2006
junho 2006
julho 2006
agosto 2006
setembro 2006
outubro 2006
novembro 2006
dezembro 2006
janeiro 2007
fevereiro 2007
março 2007
abril 2007
maio 2007
junho 2007
julho 2007
agosto 2007
setembro 2007
outubro 2007
novembro 2007
dezembro 2007
janeiro 2008
fevereiro 2008
março 2008
abril 2008
maio 2008
junho 2008
julho 2008
agosto 2008
setembro 2008
outubro 2008
novembro 2008
dezembro 2008
janeiro 2009
fevereiro 2009
março 2009
abril 2009
maio 2009
junho 2009
julho 2009
agosto 2009
setembro 2009
outubro 2009
novembro 2009
dezembro 2009
janeiro 2010
fevereiro 2010
junho 2011
maio 2012
setembro 2012

previous posts

  • Os nomes de Peter Brötzmann e de Joe McPhee são g...
  • Esta semana, no sítio do costume... [PuroJazz], R...
  • Que me lembre, nunca antes tinha ouvido Mike Osb...
  • Uma boa notícia para quem andava à procura deste ...
  • Remexo a gaveta à procura de um disco. Vem-me à mã...
  • Evocar Duke Ellington remete imediatamente para o...
  • Quando Ella cantava, Duke encantava-se. E Benny G...
  • Steve Lehman’s Camouflage Trio - Interface (Clean...
  • No sábado passado, o jazz comemorou o centenário ...
  • Tribute to Eric Dolphy

  • links

  • Improvisos ao Sul
  • Galeria Zé dos Bois
  • Crí­tica de Música
  • Tomajazz
  • PuroJazz
  • Oro Molido
  • Juan Beat
  • Almocreve das Petas
  • Intervenções Sonoras
  • Da Literatura
  • Hit da Breakz
  • Agenda Electrónica
  • Destination: Out
  • Taran's Free Jazz Hour
  • François Carrier, liens
  • Free Jazz Org
  • La Montaña Rusa
  • Descrita
  • Just Outside
  • BendingCorners
  • metropolis
  • Blentwell
  • artesonoro.org
  • Rui Eduardo Paes
  • Clube Mercado
  • Ayler Records
  • o zurret d'artal
  • Creative Sources Recordings
  • ((flur))
  • Esquilo
  • Insubordinations
  • Sonoridades
  • Test Tube
  • audEo info
  • Sobre Sites / Jazz
  • Blogo no Sapo/Artes & Letras
  • Abrupto
  • Blog do Lenhador
  • JazzLogical
  • O Sítio do Jazz
  • Indústrias Culturais
  • Ricardo.pt
  • Crónicas da Terra
  • Improv Podcasts
  • Creative Commons License
    Powered by Blogger