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24.11.04
 
Steve Lehman’s Camouflage Trio - Interface
(Clean Feed)


Não é segredo para ninguém que Steve Lehman bebe nas fontes de Jackie McLean e Anthony Braxton, com quem estudou e de quem herdou a velocidade, a força, destreza, a inventividade e uma certa cor. E que, ao ouvi-lo, nos remete para a memória recente da tradição dos grandes saxofonistas do jazz moderno. Não há aqui, no entanto, especial originalidade; apenas excelência ao nível da execução.

Recordo tê-lo visto ao vivo em 1999, no Old Office da Knitting Factory, em Nova Iorque, e de ter reparado no seu elevado potencial enquanto instrumentista, ideia que reforcei aquando da sua vinda a Lisboa, integrado no decateto de Anthony Braxton, para uma actuação no festival «Jazz em Agosto» da Fundação Calouste Gulbenkian.
Muitas opiniões têm posto em relevo a sua relativa pouca idade, factor que não valorizo por aí além, pois a história do jazz está repleta de grandes artistas que deram o melhor de si em tenra idade. No entanto, este aspecto não deixa de ser surpreendente, pois um tal nível de maturidade musical é mais vulgar encontrar‑se em gente mais adiantada no somatório de anuidades vivenciais. De qualquer modo, não será despropositado ter em conta que a revista DownBeat, em 1997, lhe atribuiu o prémio de "melhor saxofonista alto na classe sub-21". isto pode querer dizer qualquer coisa...
Steve Lehman é, pois, um saxofonista (alto e sopranino) com ouvido e sensibilidade estética apurados, artista talentoso e tecnicamente bem apetrechado. Num contexto ao vivo, mercê do imediatismo da criação espontânea em directo, estas características fazem-se notar com maior acuidade. Percebe-se melhor quer o pensamento musical, quer o trabalho sobre composições (Lehman escreveu para grande orquestra), quer ainda a técnica de execução instrumental, a cuja investigação se tem dedicado com afinco.
Uma boa amostra desse labor de mente e coração é o recente Interface, gravado em Coimbra, num concerto ao vivo realizado no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra. Com Mark Dresser e Pheeroan akLaff, um par de músicos que tanto deve à robustez motora, como à subtiliza no desenho rítmico, nos contrastes dinâmicos e nos detalhes de construção harmónica, Lehman dá uma lição do estado da arte quanto aos mais recentes avanços estéticos do saxofone alto no jazz actual.
Dresser assume-se como o complemento ideal, ao criar um quase efeito de drone no contrabaixo. Este, domina a estruturação das composições, reforçada pela tensão gerada pelos cambiantes percussivos de akLaff, que faz incidir raios de luz sobre o fraseado impressionante de Steve Lehman, numa lógica entrecruzada de momentos de grande intensidade, seguidos de lírico relaxamento, tudo na mais ampla liberdade de expressão artística. Em Interface, Steve Lehman demonstra uma combatividade, um fulgor e uma urgência de dizer, que impressiona muito favoravelmente.
 


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