Image hosted by Photobucket.com
1.2.06
  Diggin', ao vivo na Trem Azul

A estreia do trio Diggin’, em concerto na Jazz Store da Trem Azul, teve o mérito principal de deixar claros alguns aspectos da música desta nova formação. Um inquestionável ponto a favor é que Alípio Carvalho Neto, saxofone tenor, Carlos Barretto, contrabaixo, e Rui Gonçalves, bateria, não deixaram que se instalassem dúvidas quanto à forma e aos fundamentos daquilo que se ouviu. Quer isto dizer que, longe de se ter ouvido qualquer coisa de indistinto, turvo ou confuso, a música apresentou propósitos claros, direcção definida e sentido das proporções, resultado do domínio que se esperava da parte de três instrumentistas talentosos e experimentados.
É certo que poderiam ter ido muito mais longe nessa afirmação de princípios e de propósitos, bem como na demarcação porventura mais clara do território em que pretendem inscrever a música do Diggin’, grupo que, segundo Alípio Carvalho Neto, parte da ideia de procura, de «arqueologia da novidade», que esteve na base do convite a Carlos Barretto e a Rui Gonçalves para, em conjunto, fazerem a experiência.
Porém, e compreensivelmente, ressalvados os 10/15 minutos iniciais, o Diggin' arriscou pouco nesta primeira investigação “arqueológica”, tendo optado por navegar à vista das composições, uma sequência de três temas originais do saxofonista: Nissarana, que tem a ver com a ideia de libertação (going out), de carácter barroco e inspiração dolphyana; Tripus, que se funda na noção de trio, assente em três centros tonais e três escalas diferentes; e Snug as a Gun, inspirado num verso do poeta irlandês Seamus Heaney. A estes três somou-se um quarto tema de improvisação colectiva, a finalizar.
Ao longo dos cerca de 45 minutos de actuação, sentiu-se algum receio de soltar amarras, principalmente de Carlos Barretto, algo preso à exibição das malhas com que tece o virtuosismo que lhe é conhecido, ora hesitante em fazer trepidar a sala e catapultar os outros dois, ora tímido no arranque, quando Alípio pontualmente tentava incendiar o cenário. Noutras alturas era o saxofonista quem, inesperadamente, lançava água na fervura, travando Barretto e Rui Gonçalves, que, entre um e outro, ficava à espera de decisões claras e inequívocas, abstendo-se também ele de assumir a sua quota no comando do trio. Que neste aspecto ganhará tanto mais quanto maior vier a ser a autonomia e a capacidade decisória instantânea de cada elemento. Para já, o nível de interacção que se ouviu é muito interessante e deixa antever boas perspectivas. Uma coisa é certa: aqui há matéria-prima para trabalhar, canalizando recursos para o discurso colectivo, com prejuízo do monólogo expositivo.
Em suma, sem prejuízo dos bons momentos proporcionados a uma assistência interessada, e há muito trabalho pela frente e decisões importantes a tomar quanto ao que é manter, acrescentar ou lançar fora, assim seja essa a vontade colectiva. Além de remar para o mesmo lado, é preciso chegar à beira do abismo, questionar-se e arriscar o mergulho em águas profundas, onde se joga tudo, para ganhar ou perder. É lá que se esconde o mistério que o Diggin’ ainda há de revelar. Por enquanto, há três músicos com um trio em construção. O que não é pouco, para quem se encontrou para tocar a primeira vez juntos, enquanto tal, uma hora antes do concerto.

 


<< Home
jazz, música improvisada, electrónica, new music e tudo à volta

e-mail

eduardovchagas@hotmail.com

arquivo

setembro 2004
outubro 2004
novembro 2004
dezembro 2004
janeiro 2005
fevereiro 2005
março 2005
abril 2005
maio 2005
junho 2005
julho 2005
agosto 2005
setembro 2005
outubro 2005
novembro 2005
dezembro 2005
janeiro 2006
fevereiro 2006
março 2006
abril 2006
maio 2006
junho 2006
julho 2006
agosto 2006
setembro 2006
outubro 2006
novembro 2006
dezembro 2006
janeiro 2007
fevereiro 2007
março 2007
abril 2007
maio 2007
junho 2007
julho 2007
agosto 2007
setembro 2007
outubro 2007
novembro 2007
dezembro 2007
janeiro 2008
fevereiro 2008
março 2008
abril 2008
maio 2008
junho 2008
julho 2008
agosto 2008
setembro 2008
outubro 2008
novembro 2008
dezembro 2008
janeiro 2009
fevereiro 2009
março 2009
abril 2009
maio 2009
junho 2009
julho 2009
agosto 2009
setembro 2009
outubro 2009
novembro 2009
dezembro 2009
janeiro 2010
fevereiro 2010
junho 2011
maio 2012
setembro 2012

previous posts

  • Tim Berne, saxofonista das minhas preferências, é ...
  • Quem é Marc Edwards? Entrevista de Taran Singh.
  • Número de Fevereiro da All About Jazz-New York:Ba...
  • «– Na música dos MÉCANOSPHÈRE, qual é o grau de im...
  • Terça, 31 de Janeiro, é dia de estreia ao vivo do ...
  • Ernesto Rodrigues, na Down Beat de Fevereiro de 20...
  • Pás! Nova edição de Ernesto Rodrigues (viola), ago...
  • Este não é fácil de encontrar, mesmo em segunda mã...
  • Michel Delville & Andrew NorrisFrank Zappa, Captai...
  • MULTIMEDIA A História da Música multimedia é um em...

  • links

  • Improvisos ao Sul
  • Galeria Zé dos Bois
  • Crí­tica de Música
  • Tomajazz
  • PuroJazz
  • Oro Molido
  • Juan Beat
  • Almocreve das Petas
  • Intervenções Sonoras
  • Da Literatura
  • Hit da Breakz
  • Agenda Electrónica
  • Destination: Out
  • Taran's Free Jazz Hour
  • François Carrier, liens
  • Free Jazz Org
  • La Montaña Rusa
  • Descrita
  • Just Outside
  • BendingCorners
  • metropolis
  • Blentwell
  • artesonoro.org
  • Rui Eduardo Paes
  • Clube Mercado
  • Ayler Records
  • o zurret d'artal
  • Creative Sources Recordings
  • ((flur))
  • Esquilo
  • Insubordinations
  • Sonoridades
  • Test Tube
  • audEo info
  • Sobre Sites / Jazz
  • Blogo no Sapo/Artes & Letras
  • Abrupto
  • Blog do Lenhador
  • JazzLogical
  • O Sítio do Jazz
  • Indústrias Culturais
  • Ricardo.pt
  • Crónicas da Terra
  • Improv Podcasts
  • Creative Commons License
    Powered by Blogger