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31.1.06
 


«– Na música dos MÉCANOSPHÈRE, qual é o grau de improvisação e de composição?

– Não há distinção entre uma coisa e outra no que fazemos. Procuramos fazer qualquer coisa cujo interesse e sentido não seja pelo facto de ser improvisado ou de ser composto. Seria falso dizer que é música improvisada porque a finalidade do que fazemos não está no improvisar. A improvisação musical não é no que fazemos mais do que um dado do nosso propósito estético. Tem mais a ver com um método de construção, aberto e instável, ligado a questão de rapidez e urgência cada vez que tocamos, seja em palco ou em disco. Não tentamos desconstruir os gimmicks, os truques e as formas, tentamos pelo contrário encontrá-los e acertá-los mais a partir de uma espécie de Tabula Rasa, pré-formal, pré-produzida, ainda por construir. Partir do zero para acertar coisas eficazes e expressivas dentro do Caos ou a partir do Silêncio. E não tentar desconstruir as formas, as referências, os métodos, a ligação aos instrumentos.
Acho que houve muita confusão quando lançámos o primeiro disco (Mécanosphère, 2003) porque se falou muito no facto de que o disco tinha sido mais ou menos improvisado, no sentido em que foi feito numa semana e sem nada pré-composto. Todos os dias ia ao estúdio com um conjunto de ideias muito abstractas e no fim do dia tinha duas ou três músicas gravadas na sua forma final. Idem, com as vozes e os textos. Aliás, quando o Adolfo gravou as vozes nem sequer tinha percebido que era para fazer um disco. Surgiu depois esse rótulo de música improvisada e a maioria das perguntas na imprensa que se interessou pelo disco eram acerca deste facto, deste não-método. Achei curioso, porque quando ouves o disco, a música, a letra, ou quando vais a um concerto de Mécanosphère, tens uma estética, um certo discurso ou propósito, que não tem muito a ver com a música improvisada. A improvisação é uma dimensão, um meio, no que fazemos. O primeiro álbum não soa minimamente a música improvisada, soa a uma espécie de hip-hop lo-fi, industrial, instável e parasitado por pequenos acidentes, onde eventualmente se sente a mão humana, nervosa, que quebra a sequenciação, a edição limpa, os loops, e a marcialidade do costume. Cheira a acidente e a qualquer coisa de frágil ao mesmo tempo. Mas não soa minimamente a música improvisada. Há grandes músicos que dedicam a sua vida a fazer música improvisada e não penso que Mécanosphère seja um deles. Os Neubauten, durante anos, nunca ensaiavam e iam achando uns gimmicks durante os concertos que depois iam repetindo de um concerto para o outro. Esqueletos de temas, de letras, de estruturas no meio de um caos mutante. Por outro lado não faziam música improvisada, faziam uma coisa ligada ao rock, à performance, etc.
Hoje em dia, como houve uma espécie de pequena mediatização daquele rock todo fodido, ruidoso, experimental, desestruturado, post-no-wave, etc. acho que se está a perceber que improvisado ou composto não é necessariamente uma distinção relevante para falar de estética ou de propósito de determinado projecto ou banda. É um pouco como falar de electrónica. Não faz muito sentido. É um adjectivo. Não designa nada mais do que uma dimensão num objecto complexo. Há bandas de música electrónica no sentido em que a electrónica em si é mesmo o que está em jogo e em questão na sua música. É sujeito e objecto do trabalho. Também não é o caso connosco. Visto que a electrónica não anda a ser muito investigada no que fazemos. Apenas a ser utilizada, pirateada, maltratada como uma qualquer percussão ou engenho achado».

Excerto da entrevista (9/2005) publicada na webpage dos
Mécanosphère. (Foto © Luís Bento, 2004)

 


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