Jazz aos Quadradinhos # 1
«Intrigou-me a t-shirt que Rashied Ali usou na recente passagem em Portugal, durante a actuação no Fórum Lisboa, e por isso decidi usar o tema para escrever o primeiro Jazz aos Quadradinhos, aqui no Jazz e Arredores.
Como o Eduardo analisa bem melhor que eu, tenham a bondade de ler a recensão do concerto aqui. Eu fico-me pelo mexerico da minha cabeça. Porquê o raio da t-shirt com a cara do Miles e o dedo ameaçador na frente dos lábios a mandar calar a malta, ou a dizer para fazerem pouco barulho, "sshhhh…"?! Uso uma t-shirt porque isso pode dizer algo sobre a minha pessoa, e é a forma de transmitir uma qualquer mensagem, com excepção das que uso para jogar à bola... . Se uso uma t-shirt num determinado contexto social, é porque existe algo que quero partilhar, militância, opinião pessoal, um impropério, eu sei lá... .
Existe um pouco de rebeldia juvenil em certas t-shirts, mas não devo omitir que só tive coragem de escrever o artigo quando li as liner notes de SONGLINES (FMP CD53), com Peter Brötzmann/Fred Hopkins/Rashied Ali. Steve Lake escreveu assim: "I remember that Rashied Ali wore a Stars'N'Stripes [bandeira Americana] t-shirt. I don’t know if this was a political statement or if he’d just reached the bottom of his road wardrobe". Muitas vezes a militância resume-se a usar uma t-shirt, o que é uma merda, porque me chateia não fazer mais que isso. Não me passou pela cabeça usar uma t-shirt com a bandeira portuguesa (na verdade, só com a bandeira estampada ainda não vi nenhuma; os nossos designers devem ser envergonhados...), sem ser em jogos da selecção nacional. Défice patriótico?!
Fora este um artigo científico e teria partido da hipótese "t-shirt = militância", para chegar à conclusão que eu ando sem paciência para Portugal. What about Rashied?!
Sobre aquele disco, Peter Brötzmann escreve a Steve Lake o seguinte:
"Steve, old friend, (...) I did not really get the impression that a saxophone trio was on stage. There was a bass player, a drummer, a saxophonist. Three people don’t necessarily make a trio. In a way, I have always been prepared to bend through (subtle) pressure from my fellow musicians, if I had the impression it would serve the cause. (...) I still get the feeling, quite often, that YOU - and now I rather cheekily put you in the same bag with the rest of the critics – don’t have the time and sometimes not even the ability - to listen".
Brötzmann não precisa de usar t-shirts...».
João Henriques
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Jazz aos Quadradinhos é, como diz João Henriques, uma espécie de coluna foto-escrita sem periodicidade certa, acerca dos seus devaneios pessoais sobre jazz. Esta das t-shirts é primeira da série. Vistamo-la. Foto e texto do autor.