Return of the New Thing. O ironicamente denominado quarteto francês de free jazz, que inclui o britânico radicado em Paris, Dan Warburton, em piano e violino; o extraordinário Jean-Luc Guionnet, em saxofones alto e soprano; Francois Fuchs, contrabaixo; e Edward Perraud, bateria, tem um disco novo. Free jazz e free improv, dois territórios que o grupo frequenta assiduamente, arenas onde invoca a memória dos grandes criadores do passado. Não se trata apenas de aclamar tempos idos, mas de olhar em frente para as imensas possibilidades que a livre improvisação proporciona à criatividade dos músicos de hoje. E ao público do jazz, que se divide basicamente em duas secções: a dos que amam, e a dos que detestam esta música extrema.
Música que se expõe tanto à crítica feroz como ao aplauso entusiástico; que corre riscos e enfrenta desafios, o maior dos quais talvez seja o ter hoje por inspiração próxima e remota algo inventado há mais de 40 anos. No entanto, quer-me parecer que o quarteto acaba por prestar tributo menos à forma que ao espírito da New Thing (o outro nome do Free Jazz).
O segredo do sucesso – e sucesso aqui não pode ser tomado em termos quantitativos, contabilizado em função do número de pessoas que compram os discos ou que assistem aos concertos, até porque a chamada energy music não passa nas rádios e televisões e raramente aparece na imprensa escrita – resulta da concentração e da eficácia dos músicos, da sua competência, empenhamento e honestidade.
O quarteto estreou-se em 1999 com um disco homónimo na Leo Records. Anos volvidos, depois da boa aceitação crítica, o quarteto chegou ao segundo e decisivo disco, Traque, lançado na sueca Ayler Records. Neste disco, o quarteto prosseguiu a homenagem à tradição do género, subvertendo-o e actualizando-o através de um mínimo de estruturação antecipada. O mesmo caminho que trilha no mais recente Crescendo, editado pela polaca NotTwo Records. Em Crescendo a componente da improvisação é eventualmente maior que no disco precedente, que soa um pouco mais estruturado. O alinhamento comporta dois temas longos, de 35 e 25 minutos, que dão tempo e espaço para variar ao nível do andamento, carregar nas tintas ou desenhar a traço fino, saturar a mistura ou refinar a frase mínima. O propósito libertário mantém‑se intacto, fiel ao modelo inspirador. Tal como a concentração no desenvolvimento das ideias-chave enunciadas pelos membros do quarteto, que servem de mote à improvisação colectiva. A música toma direcções insuspeitas, como imprevisível é a sucessão de papéis entre acompanhantes e solistas. Um grande ponto a favor desta leitura franco‑britânica.
Return of the New Thing - Crescendo (NotTwo Records, 2005)