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8.5.06
 

Gerry Hemingway Quartet ao vivo na Culturgest, Lisboa, 6 de Maio. Estulto seria destacar individualidades num concerto deste dream team que jogou o jogo da excelência na execução das engenhosas composições de Hemingway, pensadas e escritas para os músicos que o acompanham (como o faziam Ellington e Mingus…). É justamente de excelência que se trata, quando se ouve Gerry Hemingway em qualquer (sublinho, qualquer) dos grupos que lidera, trios, quartetos, quintetos, nas mais variadas equipas de músicos e géneros, desde o solo de percussão, à composição contemporânea, passando pelos grandes exercícios orquestrais. O caso vertente não constituiu, pois, excepção.
Em palco, além de Gerry Hemingway, estiveram o saxofonista tenor alemão Matthias Schubert, no lugar que tem sido ocupado por Ellery Eskelin (não o fez esquecer, mas contribuiu eficazmente com o seu estilo próprio, mais leve e menos encorpado que o de Eskelin), Herb Robertson (dou um doce a quem me trouxer um trompetista com idêntica garra e semelhante verve, que não seja Paul Smoker, bem entendido…), e o mais antigo companheiro de Gerry Hemingway nestas voltas, Mark Helias, com quase 30 anos de trio BassDrumBone, com o trobonista Ray Anderson, em contrabaixo e baixo eléctrico com extensões groove, funk e afro que só enriqueceram a mistura.
Rica de conceitos e ideias, vitaminada e bem-humorada, a música tocou moderadamente as raias da paródia no melhor sentido (não há como Herb Robertson para desatar esse lado eminentemente lúdico de quem a brincar faz coisas muito sérias). Beneficiando em muito das noções em tempo avançadas por Anthony Braxton, abarca uma profusão de estilos que harmonicamente se diluíram na estruturação das peças, nas quais predominou uma linguagem complexa e colorida, ritmicamente variada, que tem como parente próximo o free bop, mais free que bop, mas que não se deixou aprisionar numa única fala.
Ponto alto foi também a possibilidade de assistir à especial relação dos músicos entre si, à forma como articuladamente engrenaram em laboriosa produção de tempo, a mesma que se pode encontrar nas recentes edições Clean Feed, "Devils Paradise" e "The Whimbler". Todos, assumindo por inteiro o papel de compositores instantâneos e extravagantes arranjadores, souberam interagir livremente como membros de um único e orgânico ser.
Em suma, assistiu-se a uma excelente concerto, que foi também uma lição proveitosa de como é possível hoje tocar música original, jazz “erudito” com apelo popular, sem obediências a cânones ditados por quem quer que seja que não os próprios intervenientes, sem imitar os clássicos, resultando numa abordagem renovada, da qual, paradoxalmente ou não, os mesmos clássicos se haveriam de orgulhar.
O estado da arte da música improvisada moderna emergente do jazz desembocou na Culturgest. O Gerry Hemingway Quartet, comunicando intensamente entre si e com o público, deixou uma marca profunda e indelével na paisagem.

 


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