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2.1.06
 

Ouvi com atenção o novo disco de Vinny Golia, Sfumato, que a Clean Feed acaba de editar. Mais um tiro certeiro da editora portuguesa e outro importante título a adicionar à vasta discografia do multi-instrumentista.
Fiquei muito bem impressionado com o que ouvi. Para a história ficou um grande concerto deste quarteto em Coimbra, em Junho de 2003. Aproveitando a estadia em Portugal, o grupo passou pelo ora defunto estúdio Shangri La e gravou estas nove composições originais de Vinny Golia. Que se ouve? Fundamentalmente, tudo aquilo que constitui a marca d´água de Vinny, branco do Bronx que migrou para Beverly Hills, Califórnia, e lá foi criando um body of work impressionante, como compositor, director de orquestra e instrumentista exímio que o é das famílias das flautas, clarinetes e saxofones. Mestre Golia é ainda, reconhecidamente, um especialista da combinação de timbres de sopros com cordas e percussão, um compositor e arranjador dos maiores que o jazz tem, para todo o tipo de formações, e Sfumato é outro bom exemplo dessa arte maior de swingante recombinação de polirritmia e contraponto, que trás consigo sementes de futuro.
O trompetista texano Bobby Bradford, antigo companheiro de Ornette Coleman e de John Carter; o contrabaixista Ken Filiano, que há muito trabalha com Vinny, e o baterista Alex Cline, completam o quarteto que participou no Jazz ao Centro - Encontros Internacionais de Coimbra.
Bobby Bradford deixou marca profunda no jazz norte-americano da segunda metade do século passado. Tocou com Ornette Coleman e Eric Dolphy nos anos 60, tendo integrado o quarteto do primeiro em substituição de Don Cherry. Manteve uma colaboração duradoura com o New Art Jazz Ensemble, do clarinetista John Carter, que o tornou conhecido de um público mais alargado. Desaparecido John Carter, Bobby Bradford fundou o seu próprio quarteto, o Mo’tet, que incluiu Vinny Golia e ocasionalmente Marty Ehrlich. Fez ainda parte do Spontaneous Music Ensemble, do britânico John Stevens.
Músico de primeira linha, Ken Filiano possui uma paleta musical de largo espectro, que inclui a música contemporârea, o jazz e a improvisação espontânea. Tem participado em inúmeros projectos e festivais nos EUA, Canadá, Europa e América do Sul, ao lado de Warne Marsh, Vinny Golia, Steve Adams, Barre Phillips, Bertram Turetzky, Joelle Leandre, John Carter, Bobby Bradford, RoswellRudd, Ted Dunbar, Jimmy Cleveland, Paul Smoker e o ROVA Saxophone Quartet, em paralelo com o ensino em diversas universidades americanas.
Alex Cline começou cedo a actividade criativa, inicialmente em bandas de rock, com o irmão gémeo e guitarrista, Nels Cline. Mais tarde, expandiu os seus interesses ao jazz e à new music pela mão de Vinny Golia e de Julius Hemphill, de cujo trio fez parte.
A música do quarteto de Vinny Golia evoca o jazz west coast, perfumado de blues, servido por belos uníssonos tocados pela dupla de sopradores. Música rica em subtilezas melódicas, harmónicas e rítmicas, esbate a fronteira entre composição e improvisação, dificilmente perceptível mesmo ao ouvinte mais treinado e atento. V
isita os universos musicais de Anthony Braxton, Ornette Coleman e Albert Ayler, cujos sinais identitários se apresentam “esfumados” através do olhar absorvente de Vinny Golia, que evita cair na citação ou na homenagem. Por outras palavras, Sfumato é jazz que se vê ao espelho, pula e avança.

 


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