A chegada de cada disco novo de ou com Tim Berne é sempre antecedida de uma certa expectativa. Por dois motivos essenciais: primeiro, Berne, apesar de ser um músico prolífico e de participar em inúmeros projectos próprios e de terceiros, tem sempre algo de novo a dizer. Em segundo lugar, depois da publicação de The Sublime And, do grupo Science Friction, suscitou-se a questão de saber que novas direcções tomaria a música de Berne, que entretanto atingira picos de complexidade técnica nunca vistos no saxofonista. Ou seja, iria o músico insistir nos projectos de grande fôlego, subindo, porventura, um ou vários degraus em direcção a um suposto opus magnum em termos de construção e de duração das composições, ou faria uma inflexão, um back to basics em direcção ao cerne de Berne, lançando mão da simplicidade formal, escassa instrumentação e duração confinada a limites mais comuns no jazz?Ouvindo Souls Saved Hear, do trio Big Satan, dá para perceber que, tratando-se do novo disco de um colectivo sem liderança marcada de qualquer dos seus membros, ainda não foi desta que Tim Berne deu a conhecer a opção que se segue. O caso aqui é outro e reincide no trabalho cooperativo que o trio tem vindo a realizar. Tim Berne e Marc Ducret, tal como nas anteriores edições do Big Satan, metem a mão na massa, repartindo entre si as composições. Tom Rainey também assina uma delas (Hostility Suite). Em todas se optou claramente pela economia de meios. O disco ronda os 47 minutos e nenhum dos 9 temas ultrapassa os 10 minutos. A opção considerada incluiu a gravação em estúdio de um álbum conciso e concentrado, em que todas as notas contam. Não há nada a mais nem a menos, o que resulta numa utilização assaz eficiente do tempo e do espaço, com apertada concentração e parcimónia na gestão das pausas e silêncios. Marc Ducret tem aqui um papel fundamental, ao pôr de lado a distorção da guitarra, substituindo-a por uma abordagem acústica e eléctrica não tão carregada, que melhor sublinha os contornos das figuras. Ducret é um fora de série, um dos mais (ou o mais) interessantes guitarristas da actualidade, que faz de cada nota um hino ao bom gosto e ao rigor na concepção do som colectivo. A isto soma-se um tratamento rítmico condicente por parte do inventivo Tom Rainey, que tanto propulsiona as operações como preenche milimetricamente os espaços, acentuando o detalhe de cada motivo.Souls Saved Hear vem a ser um realmente disco muito bom, o que é recorrente em Tim Berne e em particular na frutuosa associação a Marc Ducret e a Tom Rainey. Que aqui se reconfirmam como excelentes improvisadores e organizadores de sons. A não perder.