Olho o programa da chamada "Festa do Jazz" (em 4ª edição) e bocejo só de ler o que lá está escrito. Valha-me S. Luiz! Sassetti, João Paulo e Wishful Thinking valeriam a deslocação, mas não. Nem assim, pois tal afronta não pode ficar impune. Mil vezes o José Cid, que a 1 de Abril (com bis no domingo, 2 de Abril, diz agora o Manuel João Vieira), no Maxime, à Praça da Alegria, em Lisboa, será muito justamente homenageado pela longa e proveitosa carreira de artista da canção ligeira. Festa é festa! Mais a mais, trata-se de um ícone pop, um referencial da minha geração, que muito respeito e admiro.
Vejo por aí em jornais e revistas uma nova moda que é falar do conteúdo do leitor de mp3 de cada um, numa espécie de revisão actualizada do velho provérbio “diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”. Ou quase. Alinhando, digo que o meu giga inteiro está preenchido até ao telhado com coisas tão diferenciadas como Queens of the Stone Age, sempre a abrir em concerto no festival Lowlands, Holanda 2004, directamente da soundboard aqui para a caixinha mágica; segue-se mais ou menos por esta ordem, "Dogon A. D.", de Julius Hemphill, que Tim Berne fez o especial favor de deixar descarregar gratuitamente da página da sua Screwgun Records (uma obra-prima de Hemphill, por sinal); depois, John Spencer Blues Explosion, quando ainda se chamava assim (agora é só Blues Explosion, segundo li algures); Little Feat (do grande Lowell George) num concerto de 1973, em Rochester, Nova Iorque; Comets on Fire, "Field Recordings From de Sun" (discaço, Vasquinho!) e "Out to Lunch", revisão de Otomo Yoshihide com a New Jazz Orchestra, do clássico modernista de Eric Dolphy, recente edição da japonesa Doubt Music. Que Gigabyte!
Um clássico da spacey fusion raiana em três temas de demorada explanação: Celestial Road, Say, e I'll Wait For You. Strange Celestial Road faz um belo par com Lanquidity. Mais uma viagem pelos deslumbrantes caminhos celestes, imensos domínios de Ra.
Esta semana, no Jazz on 3, John Taylor em concerto. Pianista britânico veterano, Taylor apresenta-se com um trio novinho em folha, em que participam o também veterano e contrabaixista sueco Palle Danielsson e o baterista conterrâneo de John Taylor, Martin France.
Lembrando Horace Tapscott em Nova Iorque. Quem ouviu The Dark Tree 1 & 2 (hatOLOGY), com John Carter, Cecil McBee e Andrew Cyrille, nunca mais esquece a experiência. «On The Dark Tree they created music of power and drama, beauty and spirit. It's a shame we had to wait so long to hear it, and now we should treasure it». - Art Lange
A 28 deste mês de Março, o pianista norte-americano Thollem McDonas terminou a produção do novo álbum de piano solo, Racing the Sun/Chasing the Sun, o segundo de três que gravou de 2004 para cá.
«This album consists of live recordings of the first halves of two solo piano concerts layed side by side, woven in and out of each other. One concert from AreaSismica in Forli, Italy (Dec. 2005) and the other at the Musicians Union Hall in San Francisco (March 2006). All music is in the order it was performed. I cut some space here and there but mostly am manipulating only volume levels to get this woven effect. I did not cut and paste, all editing was done on two tracks only, one track for the concert in italy, the other for the SF concert».
Lisboa, ZDB - 31 de Março, 23h00
IFF + Travassos + Manuel Mota + Eduardo Raom + Goma Vect Machine
Apostados em traçar estratégias conciliatórias entre o analógico e o digital, Iff, Travassos, Manuel Mota e Eduardo Raom percorrem o infindável espectro de possibilidades que se abrem no campo da electroacústica, numa busca incessante do equilíbrio entre modelação sonora e apuramento de texturas microscópicas. Os sons produzidos, marcados pela ambiguidade e urgência comunicativa, coexistem contudo num mesmo plano, traçando-se uma bissectriz entre multiplicidade e diversidade à luz de um minucioso e ambicioso tratamento da matéria sonora. Uma espécie de simbiose orgânica estabelece-se entre as forças intervenientes fruto do veículo de transmissão por excelência destes músicos: a improvisação e criação em tempo real.
Goma Vect Machine é um projecto experimental que explora a poesia visual como ferramenta de improvisação e intervenção em ambientes e espaços diversos. Emergem realidades imaginárias, interagindo com o ambiente sonoro, distanciando-se de quaisquer regras ou conteúdos. É um passeio visual por formas gráficas simples, criadas através da linguagem de programação.
WISHFUL THINKING
Alípio Carvalho Neto sax tenor
Johannes Krieger trompete
Alex Maguire piano
Ricardo Freitas baixo eléctrico
Rui Gonçalves bateria
1 de Abril 18:00
Teatro-Estúdio Mário Viegas
Lisboa
O que a VARIABLE GEOMETRY ORCHESTRA provou é que há outro jazz emergente, que desponta e se ergue das cinzas do género, apoiado no melhor que a livre-improvisação tem para dar, espécie de tertium genus diferente do que se conhece no panorama das orquestras de free jazz ou de free improv, europeias ou americanas, do passado e da actualidade. Com uma vivência musical muito para além das pré-formatadas regras de organização sonora. Há algo de novo que se conjuga com o que é comum a outras linguagens. O resultado prático é uma espantosa e empolgante sucessão de quadros musicais expostos com grande convicção, mérito de todos os participantes e em especial de Ernesto Rodrigues, diligente congregador de vontades e organizador sonoro de gabarito.
«A música produzida pela VARIABLE GEOMETRY ORCHESTRA resulta do jogo do material acústico versus o electrónico, numa contínua busca de pequenos detalhes e significados - o som rompe do silêncio para nele voltar a mergulhar. Com esta organização formal do caos, tenta-se aplicar novos conceitos de indeterminação e composição instantânea, através da erupção assimetricamente alternada de momentos de som e silêncio (ausência de som identificável) com predominância para estes últimos, seja pela emissão de sons de características subliminares e psico-acústicas, seja pela completa ausência de sons, permitindo assim aos músicos recuperar o seu ritmo natural de respiração e sentido aleatório de pulsação, bem como escutar toda a espécie de acontecimentos sonoros que estejam a ocorrer nesse preciso momento no espaço envolvente, ou então simplesmente escutar o que outro músico tenha começado, entretanto, a fazer, sem a preocupação de responder imediatamente e assim encher de forma inútil o espaço sonoro».
«The music that is produced by the VARIABLE GEOMETRY ORCHESTRA results from the juxtaposition of acoustic and electronic sound matter, that constantly searches for small details and meanings – the sounds emerge from nothingness only to submerge themselves back into the initial silence. The subsequent formal organization of chaos tries to apply new concepts of indeterminism as well as instantaneous composition, through the asymmetrical eruption of alternated moments of sound and silence (the absence of identifiable sound). Nevertheless, the latter prevail. The sounds being produced have subliminal and psycho-acoustic characteristics and include the possibility of complete silence. This leaves space for the musicians to regain their natural rhythm and respiration, as well as their sense of random pulsation. It also allows them to listen to all the sound events that are happening at any given moment and thus to act accordingly or, contrarily, to simply listen to what some other musician has just begun, without responding immediately and thus filling up the musical space unnecessarily».
Saturday, 1st April, at 23h00, the VGO will play within the context of the Mass_Free_Ensemble Sessions, being held at the ZDB Gallery. The orchestra is directed by Ernesto Rodrigues.
Sábado, 1 de Abril, às 23h00. ZDB, Lisboa
Esta rapaziada colorida e bem disposta está-se mesmo a ver que dá pelo nome colectivo de Grateful Dead. Estavam ainda no princípio, algures em 1967. Levavam dois anos de um caminho de 30 que percorreram juntos (menos Pigpen, que morreu em 1973). Da esquerda para a direita, Jerry Garcia, Ron "Pigpen" McKernan, Bob Weir, Bill Kreutzmann e Phil Lesh. Um vício antigo.
Marc Ribot em entrevista à All About Jazz. Conversa essencialmente sobre Spiritual Unity, o grupo que formou com Roy campbell, Henry Grimes e Chad Taylor, para tocar peças compostas por Albert Ayler, com disco homónimo na Pi Recordings. «That's the Way I View It From New York».
«(...) Whether or not Ayler is “jazz” or not is, in my opinion, up for grabs. He can be productively written into a history of jazz, into a history of wider improvisational music, into a history of punk rock in terms of the intensity of the experience — and also productively written into a history of religious/ritual music. Whether he’s jazz or not, I don’t know, but he definitely seems to have come out of the free jazz movement. You know, this term fools a lot of people. They seem to think it means, “gosh, now we can do whatever we want.” But in fact, every one of the major free jazz players invented a new formal system of improvising (...)».
Brotherman In The Fatherland, Live In Germany 1972. Roland Kirk inédito (!) e ao vivo. Gravação de 3 de Março de 1972 na Funkhaus de Hamburgo, com Kirk em saxofone tenor, manzello, stritch, flauta e clarinete, apoiado por Ron Burton, piano, Henry Pete Pearson, contrabaixo, e Richie Goldberg, bateria. Joe Texidor reforça a percussão. Com este Brotherman aconteceu o que vai sendo corriqueiro com bootlegs importantes (e outros menos importantes), como sucedeu à recente edição de One Down, One Up, do John Coltrane Quartet: depois da transmissão radiofónica (e neste caso, também televisiva) em directo, gravação passou a circular clandestinamente entre os traders, admiradores e coleccionadores de registos de Roland Kirk durante mais de 30 anos, até que inopinadamente se anuncia a edição “oficial” do concerto, prevista para daqui a dias, a 4 de Abril próximo. Há a garantia dada pela HYENA Records de se tratar da obra na íntegra, com som stereo de alta fidelidade, tal como preservada pela Rádio Hamburgo em 1972. Da Hyena já saíram outras pérolas de Kirk ao vivo, como The Man Who Cried Fire e Compliments of the Mysterious Phantom. Daqui a uma semana já se pode provar o "novo" Rahsaan.
Sight On Sound, primeira mostra em Portugal do artista plástico e músico norte-americano Tim Kerr. Em exposição na Jazz Store da Trem Azul, de 1 a 30 de Abril, estará uma série de quadros em técnica mista sobre figuras do Jazz e da luta pelos Direitos Civis na América.
ULTRALYD ao vivo na ZDB, a 24 de Março passado.
«Quarteto norueguês liderado por Kjetil Brandsdal (Noxagt), apresenta uma pesadíssima e explosiva proposta que reúne o rock vindo do metal mais desconstruído com a escola feérica do free jazz. Baixo mutilante, de fazer balouçar intestinos; guitarra de suavizar tímpanos; bateria galopante, entre expressão livre e metronomia maníaca; e saxofone feérico, pós-Ayler, pós-Brötzmann. Celebração do feio e grotesco enquanto dínamos, aqui em alto caudal ofensivo». Fotos de Nuno Martins (telemóvel).
Manuel Mota, citado por REP na folha da AnAnAnA: «O jazz actual é uma música abstracta. Para mim, o jazz não tem uma forma. É uma vivência, um “work-in-progress” individual ou colectivo, é uma música aberta que assimila uma multiplicidade de influências (outras músicas, outras artes, influências sociais), uma música que valoriza a expressão individual, que sacraliza o momento de execução, o tocar. Fraseio, e é com essas frases que o meu discurso é construído. Assumo o som da guitarra fazendo-a soar na sua totalidade, explorando todas as suas possibilidades. O que fez John Coltrane ao longo da sua carreira? Quantas vezes não foi questionada a sua música em relação ao jazz? Também os blues, a sua depuração e ao mesmo tempo a sua permeabilidade e abertura são uma componente essencial do meu trabalho, como o será de muito do jazz. Ainda este estava preso às estruturas do bebop e já John Lee Hooker praticava uma forma musical de estrutura aberta, ainda que, como é óbvio, não esteja a defender que Hooker era um músico de vanguarda...».
revista de fio a pavio. "Under Review". DVD Chrome Dreams Records
Robots atacam na Flur.
Sábado, dia 1 de Abril, às 23h00, no âmbito das Mass_Free_Ensemble Sessions, sob a direcção de Ernesto Rodrigues, na galeria ZDB apresenta-se a Variable Geometry Orchestra.
«A música produzida pela VARIABLE GEOMETRY ORCHESTRA resulta do jogo do material acústico versus o electrónico, numa contínua busca de pequenos detalhes e significados - o som rompe do silêncio para nele voltar a mergulhar. Com esta organização formal do caos, tenta-se aplicar novos conceitos de indeterminação e composição instantânea, através da erupção assimetricamente alternada de momentos de som e silêncio (ausência de som identificável) com predominância para estes últimos, seja pela emissão de sons de características subliminares e psico-acústicas, seja pela completa ausência de sons, permitindo assim aos músicos recuperar o seu ritmo natural de respiração e sentido aleatório de pulsação, bem como escutar toda a espécie de acontecimentos sonoros que estejam a ocorrer nesse preciso momento no espaço envolvente, ou então simplesmente escutar o que outro músico tenha começado, entretanto, a fazer, sem a preocupação de responder imediatamente e assim encher de forma inútil o espaço sonoro».
ernesto_rodrigues violin, viola, direction; pedro_costa violin; guilherme_rodrigues cello; hernâni_faustino double bass; david_rodrigues harp; sei_miguel pocket trumpet; eduardo_chagas trombone; eduardo_lala trombone; bruno_parrinha clarinet, alto clarinet; miguel_bernardo clarinet; jorge_lampreia flute, soprano saxophone; nuno_torres alto saxophone; rui_horta_santos tenor saxophone; helena_ornellas alto saxophone; rodrigo_amado baritone saxophone; luís_lopes electric guitar; ivan_cabral didgeridoo; jorge_trindade tapes; adriana_sá brazilian harp, electronics; carlos_santos electronics; rafael_toral electronics; miguel_martins melodica, xylophone, percussion; césar_burago percussion; monsieur_trinité percussion; josé_oliveira drums, acoustic guitar.
O compositor e pianista britânico Mike Westbrook fez 70 anos quinta-feira passada. Assinalando a data, Jez Nelson convidou-o para a emissão de ontem (transmitida em broadcast durante toda esta semana) do Jazz on 3, da BBC Radio 3. Westbrook gravou um set de brit-jazz e free improv com o quarteto Art Wolf (na foto: Mike Westbrook, Chris Biscoe, Pete Whyman e Kate Westbrook), aqui em versão Plus, com a adição do contrabaixista Tim Harries e do cabeludo baterista Seb Rochford, membro do quarteto britânico anarco-pfunk-free improv, Polar Bear.
A reedição de um só Tolliver já seria motivo de júbilo. De três, é uma espécie de bênção para os admiradores do trompetista. Nem mais: a Mosaic Records juntou numa caixa só os dois volumes de Live At Slugs e Live In Tokyo. Aos três LP´s originais soma-se o aliciante habitual (além da edição numerada, claro está) de um razoável número de temas extra, gravados ao vivo nas mesmas sessões de 1970 e 1973. Charles Tolliver & Music Inc: Stanley Cowell, piano; Cecil McBee, contrabaixo; e Jimmy Hopps, bateria. Em Live In Tokyo, Clint Houston substitui Cecil McBee no contrabaixo, e Clifford Barbaro ocupa o lugar de Jimmy Hopps na bateria.
Mosaic Select (Live At Slugs Vols 1 & 2/Live In Tokyo)
23.03.06 // 23h00
ernesto_rodrigues_viola
rui_horta_santos_clarinete
miguel_martins_melódica
Luso Café, Bairro Alto, Lisboa
Rui Horta Santos / Ernesto Rodrigues / Miguel Martins
Sun Ra passou pela Savoy uma única vez, em 1961. The Futuristic Sounds Of Sun Ra, situa-se a meio caminho entre Chicago e Filadélfia, algures entre as origens e a subsequente fase de intensa exploração cósmica. A Arkestra apresenta-se com a formação adquirida imediatamente após a chegada a Nova Iorque, naquele ano: Sun Ra, John Gilmore, Marshall Allen, Pat Patrick, Bernard McKinney Ronnie Boykins, Willie Jones, Ricky Murray e Leah Ananda. Além dos originais China Gates, Of Sounds and Something Else, Tapestry From an Asteroid, Jet Flight, Space Jazz Reverie e Where is Tomorrow?, a reedição da Fresh Sound inclui sete temas extra, de três sessões anteriores à da Savoy, de onde foram retirados Kingdom of Thunder, Space Loneliness, Space Aura, Onward, Distant Stars, We Travel the Spaceways e Early Autumn.
Jeff Gburek, guitarrista experimental norte-americano (Albuquerque, Novo México, 1963). Há quase três décadas que se dedica à investigação sonora, mantendo ocasionais incursões pelos territórios do rock (colaborações com Tom Carter e Charalambides, por exemplo). Optando por desvalorizar a técnica de execução da guitarra ("simples memórias de velhos sistemas"), Gburek aposta em revitalizar e reconstruir materiais, num espectro sonoro alargado, baseado em conceitos heterodoxos de pintura, colagem e escultura, com interessantes resultados ao nível da organização musical. Finally open to the public, a virtual playground of Gburek's mind (?), ready for your graffitti.
Aos primeiros alvores primaveris, ainda que a meteorologia os queira por força obnubilar, desponta mais um número (# 41, Primavera) da Signal To Noise, The Journal of Improvised & Experimental Music. Elliot Carter faz capa, e no interior, Anthony Coleman, Tom Verlaine, Sgt. William Thompson IV, Sunburned Hand of the Man, e mais. Também não faltam as habituais secções, comentários e opiniões críticas de quem sabe da poda e faz da STN "a" revista.
Indo directamente ao assunto que aqui me traz: a Otomo Yoshihide's New Jazz Orchestra, uma orquestra deste mundo, que mais parece do outro, ao segundo lançamento (o primeiro intitula-se singelamente ONJO), resolveu enveredar pela interpretação pós-moderna do clássico e último disco de Eric Dolphy, publicado pela Blue Note, «Out To Lunch». "
... The most beatiful onkyo sound...". Otomo Yoshihide, Axel Doerner, Aoki Taisei, Tsugami Kenta, Okura Masahiko, Alfred Harth, Mats Gustafsson, Ishikawa Ko, Sachiko M, Nakamura Toshimaru, Unami Taku, Takara Kumiko, Cor Fuhler, Mizutani Hiroaki e Yoshigaki Yasuhiro.
Do psicadelismo à fusion, com muito jazz e muito rock à mistura, faltava fazer a história completa dos Soft Machine, contextualizar o grupo enquanto referência primordial da música daquele período e biografar os seus muitos membros. É que, para além do núcleo duro formado por Robert Wyatt, Mike Ratledge, Elton Dean e Hugh Hopper, entre 1966 e 1984, Graham Bennett detalha as 24 (!) diferentes formações que a Machine acolheu no seu farto seio. Obrigatório para os admiradores die-hard e para toda a gente com interesse em conhecer a vida e obra de um dos grupos britânicos mais interessantes a operar em cheio na década de 70 do século passado. Outra forma de relembrar Elton Dean, figura de referência que há pouco mais de um mês partiu desta para melhor.
«SOFT MACHINE: Out-Bloody-Rageous», de Graham Bennett. Com introdução de Daevid Allen, Hugh Hopper e John Etheridge. Edição da SAF Publishing, editora com trabalho digno de nota nos domínios do pop, rock e jazz nos últimos 15 anos:
«We are often keen to let the musicians themselves give their side of the story; hence Michael Bruce from the Alice Cooper group's romp through the band's heyday, or Zoot Horn Rollo's harrowing tale of life under the reign of Captain Beefheart. But we have never shied away from the underdog, or rock's less familiar treasures. As a result, Robert Wyatt, Mark Eitzel, The Residents and Peter Perrett all get a look in, as well as delving behind some more familiar names like Frank Zappa, John McLaughlin, Grand Funk Railroad and Procol Harum». - SAF
Deste trio de percussionistas europeus, apenas Christian Wolfarth se dedica aqui à percussão (ainda que no sentido menos ortodoxo do termo), se descontarmos o micro‑gratinado que Günter Müller (ipod e electrónica) e Jason Kahn (laptop) geram, com provável origem em sons acústicos de percussão electronicamente modulados, combinados com outros de fonte digital. Produto típico da escola suíça da improvisação electroacústica, Drumming revela um intenso trabalho mecânico de rotação motorizada, um dispositivo orgânico que microscopicamente regista, ordena e homogeneíza impulsos sonoros, atribuindo-lhes forma, cor e textura. Dá origem a um tecido cuja representação se poderia situar algures entre sons futuristas de tráfego rodoviário e sinais crepitantes de vida que se adivinha existir para além do que sensorialmente nos é dado experimentar.
Günter Müller/Jason Kahn/Christian Wolfarth - Drumming (Creative Sources)
Concerto_terça-feira_21 de Março
Trem Azul_Jazz Store_19h30
Luís Lopes_guitarra eléctrica
Eduardo Lála_trombone
Wadada Leo Smith e ICP com Misha Mengelberg, Michael Moore e Han Bennink, na CryptoNight e CryptoNoche. Quinta e sexta-feira, 23 e 24 de Março, no Club Tropical (Culver City, California). Cryptogramophone.
Esta semana no Bimhuis, em Amsterdão: a 23, Power Ensemble & Joseph Bowie, com Luc Houtkamp, Joseph Bowie, Marije Nie, Tom Tlalim e Micha de Kanter; a 24, um concerto integrado na digressão dos 30 anos do European Jazz Ensemble, com Stan Sulzmann, Gerd Dudek, Jiri Stivin, Eric Vloeimans, Matthias Schriefl, Manfred Schoof, Alan Skidmore, Charlie Mariano, Conny Bauer, Pino Minafra, Joachim Kuehn, Rob van den Broeck, Ali Haurand, Sebastien Boisseau, Daniel Humair e Tony Levin; a 25, Coalition of the Willing, do baterista Bobby Previte, com Steven Bernstein, Charlie Hunter e Marco Benevento; e a 26, o TRIO X, de Joe McPhee, Dominic Duval e Jay Rosen.
ELTON DEAN MEMORIAL CONCERT
«On February 8 th 2006, sadly, the jazz world lost one of the major contributors to the development of jazz and improvised music here in England and Europe during the mid sixties to a week before his death.
Working with many different aspects of this creative community from Keith Tippetts’ small groups, they met at the Barry Summer school with Nick Evans and Mark Charig, Centipede, Ark and Tapestry Orchestra, to Robert Wyatt and Hugh Hopper in the Soft Machine, Brotherhood of Breath, to his own groups quartets, quintet, the famous Ninesense, and many more. He was a truly individual, professional, and very creative saxophonist, who will be sorely missed.
On May 9th at the 100 Club in London many of the musicians who were his friends and fellow travellers along this road will play in tribute to him. This is only a selection others not included will be organising further events in his memory».
ELTON DEAN’S MEMORIAL CONCERT
Playing in various combinations there will be contributions from the Dartington Improvisors Trio, Soft Machine Legacy , Dreamtime, duos, Trios, Quintets, Sextets featuring:
HARRY BECKETT, ROBERTO BELLATALLA, MARK CHARIG, LOL COXHILL, GARY CURSON, PAUL DUNMALL, JIM DVORAK, JOHN EDWRDS, JOHN ETHERIDGE, NICK EVANS, JOE GALLIVAN, MARK HEWINS, HUGH HOPPER, JIM LE BAIGUE, ALEX MAGUIRE, TONY MARSH, JOHN MARSHALL, MARCIO MATTOS, LOUIS MOHOLO, MAGGIE NICOLS, EVAN PARKER, PAUL RUTHERFORD, MARK SANDERS, LARRY STABBINS, KEITH & JULIE TIPPETTS, THEO TRAVIS.
DOORS WILL BE OPEN AT 19.30 AND THE MUSIC WILL START
AT 20.00 [8PM] ADMISSION : £12.00 AND £10.00 FOR CONCESSIONS
Tickets can be reserved and will be held until 21.00 [9pm] reservations by e-mail: hazel@cadillac.co.uk or telephone Tuesday-Friday 0207.619.9111.
DER GELBE KLANG (O Som Amarelo)
De Março a Outubro de 2006
Museu do Chiado - Museu Nacional de Arte Contemporânea
Rua Serpa Pinto, 4 - Lisboa
Produção: Granular (apoio Museu do Chiado)
«As grandes correntes estéticas que vêm caracterizando as artes plásticas foram igualmente adoptadas pela música, e senão literalmente, em alguns casos até de forma muito difusa (Erik Satie é apontado como o único compositor do Surrealismo, algo que, de qualquer modo, não é especialmente evidente), o certo é que as linhas fundamentadoras de muitas tendências do visual ganharam igualmente expressão na arte dos sons. Um exemplo imediato é o interesse manifestado por Kandinsky pela música politonal e atonal de Schoenberg, na qual ele encontrou preocupações semelhantes às que aplicava nas suas telas. A correspondência entre ambos é esclarecedora, de resto, quanto à simultaneidade das buscas encetadas nos dois domínios.
O próprio Wassily Kandinsky sentiu-se compelido a compor, e uma dessas obras, destinada ao palco, chamou-se "Der Gelbe Klang" ("O Som Amarelo"), nome que a Granular utiliza para identificar o ciclo de concertos proposto ao Museu do Chiado. Hoje, verificamos que uma boa parte da música criativa é feita por pessoas que tiveram formação em belas artes e que em simultâneo desenvolvem actividade nessa disciplina. A produção de som por artistas visuais definiu mesmo um novo rumo nas novas práticas nascidas com o século XX, razão suficiente para procurarmos interrogar o que na música há por estes dias de influência plástica ou de filiação estética coincidente. E as referências são, de facto, muitas, indo de reminiscências do Romantismo, ainda muito presente, por exemplo, na música improvisada, a correntes como o Futurismo, génese da "noise music", o Dada, reflectido sobretudo no trabalho vocal por via das pesquisas fonéticas de Kurt Schwitters, o movimento Fluxus, inspirador da generalidade dos investimentos mais experimentais, ou o Minimalismo, que vem influenciando a electrónica.
No seu poema "An Anna Blume", Schwitters refere-se mesmo aos "vinte sete sentidos" da sensorialidade, e é isso que está em questão neste tempo de derrube das fronteiras entre as artes. Não há nichos criativos, apenas diferentes campos de acção artística que cada vez mais se encontram. DER GELBE KLANG propõe-se mostrar como, colocando em evidência o que estava apenas implícito...»
FOOTLOOSE, segundo disco de Paul Bley originalmente publicado pela Savoy em 1962. Um dos melhores discos do melhor período de Paul Bley, marcadamente influenciado por Lennie Tristano, com Steve Swollow e Pete La Roca. Além das composições originais de Paul Bley, o disco reúne temas de Carla Bley e Ornette Coleman (When Will The Blues Leave). O LP da reedição BYG (na foto) é uma raridade. Em CD foi reeditado pela Vogue, como The Floater Syndrome, mais acessível.
«Há poucos músicos assim, em que a vida e obra se unem num corpo apenas. Ao longo dos seus quase 60 anos, Loren MazzaCane Connors foi mostrando a sua arte com o ritmo errante da vida. Decidiu abraçar tardiamente o instrumento que lhe deu fama, esteve longos períodos sem dedicação à música, experimentou a pintura, andou pelo rock, pela folk, mas só em finais dos anos 80 é que se aproximou definitivamente da guitarra eléctrica, e a sua técnica e composição recente abraça sem desistência a doença de Parkinson que lhe foi diagnosticada há alguns anos. Loren Connors é, como se vê, um músico de entrega total e nutre uma abertura rara por tudo aquilo que o rodeia: a união afectiva com Suzanne Langille colocou-a no centro da sua música e a sua própria linguagem esteve sempre em evolução pelas inúmeras colaborações que teve em 20 anos de activismo musical (de Keiji Haino a Rafael Toral, passando pelos seus conterrâneos como Licht, Fahey ou Thurston Moore). Sails documenta mais um pedaço da sua obra, em formato evolutivo, partindo da guitarra pura para um proto-ambientalismo imerso em drones e phasing. Há uma paz arrepiante ao longo dos vários temas que se comunicam e interligam, parecendo mostrar que o branco pode ser a cor (ou ausência desta) perfeita para ilustrar as ondas de um mar interior. Se o corpo pode definhar, como todos definham, o espírito de Loren Connors parece ir encontrando o caminho da tranquilidade eterna. Um disco belíssimo e tocante». - Flur
Antecipando a próxima e XI edição do Vision Festival, o Jazz on 3 (BBC Radio 3), de hoje até sexta-feira, transmite um duo do multi-instrumentista Joe McPhee e a sopradora canadiana Lori Freedman, num set de livre-improvisação de criar bicho, gravado ao vivo na X edição do reputado festival novaiorquino, a 18 de Junho de 2005. Antes do concerto propriamente dito, em entrevista a Jez Nelson, Mcphee elabora sobre a forma como o pensamento de Edward De Bono (o homem de quem se fala, chefe de fila e guru do "pensamento criativo" e criador do conceito de "lateral thinking") influenciou a sua abordagem musical. A finalizar a emissão, a habitual revista de discos inclui obras de Andrew McCormack, Steve Lacy e William Parker, bem como os recentes discos a solo de dois extraordinários pianistas (nem só de Mehldau vive o piano-jazz, afinal) Matthew Shipp e o veterano Ran Blake, que aos 70 anos arranca uma obra de se lhe tirar o chapéu! Jazz on 3. (foto: Peter Gannushkin)
NO FUN FEST
17, 18 e 19 Março de 2006
The Hook, Brooklyn, Nova Iorque
A MPS japonesa reeditou este disco de 1965 (originalmente publicado pela Saba, em LP), que testemunha o encontro entre dois dos maiores modernistas do jazz norte-americano daquela época: Gerge Russell e Don Cherry. Ao vivo no Beethoven Hall, em dois belos volumes. George Russell Sextet e o guest artist Don Cherry. Russell, um dos maiores cultores do modalismo (fruto do Lydian Chromatic Concept, que inventou e aprofundou) meets Cherry, acabado de sair do quarteto de Ornette Coleman, que entretanto resolvera formar o trio com David Izenzon e Charles Moffett (ouvir At The Golden Circle, vols 1 e 2, outra vez, sff), e a parecer precisar de entrar noutra onda, mais refrescante. A isso tentam ajudar, além de George Russell, em piano, Bertil Loevgren, que partilha o trompete com Don Cherry, Brian Trentham, trombone, Ray Pitts, saxofone tenor, Cam Brown, contrabaixo, e Albert "Tootie" Heath, bateria.
Rui Portugal expõe fotografias!
E é o próprio Rui Portugal (autor das fotos dos concertos do No Filter Trio e The Crack, aqui publicadas este mês), quem o diz:
«Na próxima 5ª-feira, 16 de Março [hoje!], é a inauguração da minha primeiríssima exposição do que quer seja, e neste caso é de Fotografias, e com o título de "Reflexões, Deserções e Suspensões" (todas estas palavras têm diversos sentidos na língua portuguesa), no Sítio do Cefalópode, no Largo do Contador-Mor, 4B, em Alfama (entre o Miradouro de Sta. Luzia e o Castelo), Lisboa - um sítio espectacular (que já pertenceu ao Ary dos Santos), a partir das 22h30h. Essas imagens são uma forma minha de expressar a poesia que nos rodeia (e que tantas vezes não vemos ou só reparamos à posteriori, através de fotos tiradas então). Claro que é mais do que evidente que ficarei tremendamente contente com a presença de todos vós - ou dos que vierem! Assim sendo, lá vos esperarei!
Um abraço a todos e apareçam».
Rui Portugal
Descobrem-se motivos maravilhosos nesta jornada floresta adentro. Guiado por Birgit Ulher, Lou Mallozzi e Michael Zerang, o ouvinte tem ensejo de visitar mil recantos, vegetação luxuriante, paisagens de mistério e ornitofonia desconhecida, com que facilmente se estabelecem relações de proximidade. Fragmentos, impulsos eléctricos, sopros, fricções, cores, timbres e texturas organizados num jogo de múltiplas subtilezas que expandem a linguagem instrumental muito para além dos limites que a tradição estabeleceu. Landscape: recognizable foi gravado em Chicago, em Junho de 2004. Birgit Ulher, trompete, Lou Mallozzi, gira‑discos, CDs, microfones, tubos de órgão, voz amplificada; Michael Zerang, percussão, apitos e sons de pássaros. Birgit Ulher / Lou Mallozzi / Michael Zerang - Landscape: recognizable (CS 037)
Abdul Moimême compôs a imagem a partir de capas de discos aqui comentados ou criticados. Clicando, aumenta.
A entrevista de Raphe Malik (f. 8.3.2006) a Stu Vandermark, de 2001, pode ser ouvida online na página do BostonJazzFest.
23.03.06 QUARTET
ernesto_rodrigues_viola
miguel_bernardo_clarinete
rui_horta_santos_clarinete
miguel_martins_melódica
Luso Café, Bairro Alto, Lisboa
Joe Morris Quartet
Beatiful Existence
Clean Feed
Terminado o interlúdio durante o qual se dedicou por inteiro ao contrabaixo, que para os admiradores do artista terá durado uma eternidade, Joe Morris tirou novamente a viola do saco. Em Beautiful Existence, emprestou o contrabaixo a Timo Shanko e convocou os heterodoxos Jim Hobbs (saxofone alto) e Luther Gray (bateria), músicos habitualmente fora das capas das revistas e das listas dos mais convocados. Joe Morris tem vindo a criar um espaço novo para a guitarra no jazz não tradicional. O cumprimento de algumas regras formais não compromete a limpidez de execução, clareza de ideias, fluência e groove – tudo embalado com irrepreensível bom gosto. Tecidas na malha mais fina do free bop pós ornettiano, as seis composições são tocadas pelo quarteto com assinalável entusiasmo. Sem encanar a perna à rã nem ceder a virtuosismos estultos, Morris continua a soar como nenhum outro, antes ou depois dele. - in Blitz
THE CRACK, PLUS, ao vivo no Luso Café, 02/03/2006
Inspirados em «The Doors of Perception», de Aldous Huxley, os THE CRACK decidiram perseguir a senda dos shaman, usando a improvisação espontânea como veículo para ultrapassar os limiares do entendimento e vislumbrar o que está para além das portas da percepção.
A simbiose entre instrumentos da Antiga China, da música clássica e aparelhos do mundo mecanizado de hoje, procura gerar um estado hipnótico que facultará a passagem para o outro lado da fenda e captar esse momento de fuga.
THE CRACK ::::: Travassos :: cracklebox, tapes ::
Hernâni Faustino :: contrabaixo ::
Abdul Moimême :: aquaphone, percussões, flauta ::
Guilherme Rodrigues :: violoncelo::
PLUS :: Pedro Costa :: violino :: Eduardo Chagas :: trombone::
(Fotos: Rui Portugal)