A editora norte-americana Esp-Disk continua a dar seguimento ao ambicioso projecto auto-revitalização, tanto através edições novas, que dão sequência ao trabalho que, com longos hiatos e episódios de alguma confusão relativa aos direitos sobre as gravações originais, como da reedição remasterizada de material precioso que faz parte dos arquivos de Bernard Stollman, algum dele há muito esgotado. É o caso de Sunny Murray, disco homónimo do lendário baterista da New Thing. Sunny Murray contribuiu decisivamente para a evolução do papel do baterista, libertando-o da estrita actividade de marcação de tempo, atribuindo a si próprio e a gerações de outros instrumentistas um papel central ao nível da cor, timbre e textura, muito para além da função métrica que lhes tinha estado reservada em tempos anteriores. Murray, tal como o fizeram os músicos do free jazz em geral, rejeitou o postulado segundo o qual haveria uma maneira “correcta” de tocar bateria e de tocar jazz. Para aí chegar, cruciais foram os cinco anos passados com o pianista Cecil Taylor, e, sobretudo, o período Albert Ayler, com quem gravou uma série de discos históricos e essenciais: Spirits / Prophecy / Spiritual Unity / New York Eye and Ear Control (1964), Bells e Spirit Rejoyce (1965).
O disco agora reeditado constituiu um marco importante no progresso do jazz de meados de 1960, capítulo significativo de uma longa história contada por gente como John Coltrane, John Tchicai, Cecil Taylor, Dave Burell, Archie Sheep, Albert Ayler, Ornette Coleman e Don Cherry. Linhas de força que viriam a explodir em diversas direcções na década seguinte, tendo dado origem às movimentações do Loft Jazz dos anos 70, em Nova Iorque, e às diversas correntes prosseguidas pelos músicos americanos expatriados na Europa, para onde o próprio Sunny Murray partiu logo após a gravação deste disco, pela segunda vez, e de onde retornou aos EUA, em 1971. Liderado pelo baterista, Sunny Murray, gravado em 1966, contou com o trompetista Jacques Coursil, dois saxofonistas alto, Jack Graham e Byard Lancaster, e o contrabaixista Alan Silva. A música, apesar de trepidante, é relativamente serena, brasas incandescentes em vez de fogueira, com Jacques Coursil bastante mais contido que Jack Graham e Byard Lancaster. Aos quatro temas originais (Phase 1.2.3.4.; Hilariously; Angels & Devils; e Giblet) – Douglas McGregor fez maravilhas na restauração do som de 1966 – a reedição acrescenta um bónus de cerca de 30 minutos de entrevistas com Sunny Murray e Bernard Stollman. Music is a form of magic...