Em 2004, Ernesto Rodrigues (viola, violino), Michael Thieke (clarinetes), Guilherme Rodrigues (violoncelo, pocket trumpet) e Carlos Santos (electrónica) gravaram KREIS (Creative Sources 020), trabalho aturado sobre as propriedades físicas do som, com atenção totalmente voltada para a textura em detrimento da tonalidade. Há aqui imensa actividade, só que muito à flor da pele, sem levantar ondas nem tumultos. Tudo se passa para além do tempo e do silêncio, quando o espaço passa também a assumir um papel de maior relevo. KREIS, título da obra, remete para representação espacial sob a forma de círculo, e a denominação dos temas toma diferentes graduações desse círculo), permitindo a escuta atenta referenciar a exigente gestão espácio-temporal que o quarteto realiza e que imprime à música uma respiração própria, suave e descompassada. E é ouvir sons de baixa amplitude e intensidade (salvo um caso ou outro, quando irrompe um silvo de clarinete de Thieke, acompanhado pelas cordas, no tema 4 – “112º23’”) a harmonizarem-se num prolongado e multiforme restolhar, graças sobretudo ao cuidado posto no acto de ouvir – palavra-chave destas e doutras estéticas afins. Postura que os músicos privilegiam sobre a actividade de produção sonora, interagindo entre si e com o estúdio de gravação (microfones e mistura são fundamentais) num lowercase de primeira qualidade e efeito volátil. KREIS bebe na fonte de Berlim, mas também é certo que a insect music britânica, numa versão eventualmente mais esparsa, actualizada e tributária da electroacústica (e da manipulação electrónica), tem qualquer coisa a ver com isto que aqui se passa. Bem merece repetidas e atentas audições, única forma de apreender tudo quanto o círculo encerra em matéria de som, silêncio e das subtilezas que lhes dão vida.