Kurt Rosenwinkel Quintet no Seixal Jazz
Não há nada de distintivo na música que Kurt Rosenwinkel e o seu quinteto tocaram este sábado, 22 de Outubro, no Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal. As composições, as tais que lhe têm vindo a granjear aura de “autor”, são episódios de vulgaridade, ao estilo melódico de um Pat Metheny de 5ª (vá lá, 3ª) categoria. O timbre é o mesmo de legiões de colegas seus, com a especificidade de que Rosenwinkel joga quase permanentenmente ao centro do espectro sonoro.Por outro lado, em nada ajudou o arraial de exercícios de escalas, recorrentes subidas e descidas em socalcos pelo braço da guitarra. Infeliz foi o uso de pedal de reverb, em particular nos solos introdutórios, e o pífio acto de cantar por sobre o solo ou o desenho da melodia, habitualmente captado por um microfone estrategicamente escondido na vestimenta.
Não quero com isto beliscar a inquestionável capacidade técnica do músico, apreciável na boa sustentação da mão esquerda e na fluidez ritmica da mão direita. Na verdade, a boa educação e uma adequada formação escolar nunca fizeram mal a ninguém. Facto é que a "técnica" há muito (desde sempre) que deixou de ser assunto relevante por si só, posto que continua (?) a ser um meio para atingir finalidades diversas. No capítulo da emoção e da capacidade de transportar o ouvinte para outra galáxia, o falhanço foi rotundo, mas quem me manda esperar outra coisa?! Nem Serenity, de Joe Henderson, na qual coloquei todas as minhas fichas, salvou a situação, fazendo apenas aumentar a saudade do grande saxofonista tenor. Também na música a natureza tem horror ao vazio, e neste capítulo o espaço da frescura emocional e da desejável comunicação vibrante com o público foi substituido por um produto post-fusion pré-cozinhado, homogeneizado e pasteurizado, com corantes e conservantes, servido com abundantes artifícios técnicos pour épater le bourgeois. Escândalo?! Qual quê, de tão frequente, tornou-se vulgar nos dias de hoje. Daí que o aplauso do público fosse particularmente estusiasta nos momentos em se ouvia mais um rodriguinho, ou quando o som subia de volume (à falta de outros argumentos, que remédio...), ou ainda no desenrolar de uma sucessão de efeitos publicitários desenhados mais para encher o olho que a alma – um estilo próximo do smooth jazz para consumo das massas, que pode (e deve) passar despercebido ao vivo no lobby de um hotel perto de si. Chris Cheek (sax tenor), Aaron Goldberg (piano), Omer Avital (contrabaixo) e Eric Harland (bateria), estiveram tão sintonizados com este espírito, que merecem referência enquanto funcionários medianamente cumpridores.
Em palco, Rosenwinkel – ele que é exultado e reverenciado por diversos quadrantes do establishment crítico – exibe a pose de anti-herói, compondo uma figura frágil de adolescente tardio, ar triste e abandonado, ideal para tocar a corda sensível e despertar corações mais propensos a deixarem-se levar pelo instinto maternal; o correlativo no jazz do estilo pop internacional de Enrique Eglésias, herdado de seu pai Julio, outro paradigma da devastação coronária. A avaliar pelo facies de algumas pessoas à saída, Rosenwinkel consegue ser fulminante neste aspecto. A questão mais séria é outra e coloca-se assim: que relevância pode ter esta música no contexto do jazz actual, passado ou futuro? A resposta, óbvia, teve que ser ruminada durante o que me pareceu uma eternidade. O que não deixa de ser curioso é que já vi escrito algures que Rosenwinkel reinventa o Jazz no Séc. XXI. É isso, “lava mais branco”.
Kurt Rosenwinkel Quintet. Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal, 22.10.2005 - 21h30/23h30