Boas ondas agitam o meio jazzístico português de tempos a tempos. A que ontem à noite bateu na praia de Belém veio de um grupo que já circula há algum tempo por esses palcos fora e que, segundo os ecos que vão chegando, tem causado boa impressão junto do público aficionado: o Luís Lopes Humanization Quartet. A noite em que travámos o tão aguardado encontro foi a de ontem, em mais uma edição de Jazz às 5ªs, na Cafetaria Quadrante, do Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Enquanto quarteto, digo, posto que, individualmente, estou familiarizado com os vários projectos e incursões avulso destes quatro improvisadores: Luís Lopes (guitarra), Rodrigo Amado (saxofone tenor), Aaron González (contrabaixo) e Stefan González (bateria), os sendo os dois últimos os rebentos do grande trompetista de Dallas, Texas, Dennis González. Muito interessante em razão dos resultados, esta convergência de esforços luso-americanos que, posta em movimento, deixou à evidência o intenso trabalho de preparação, ensaios, concertos e toda a rodagem que faz soar o Humanization Quartet como um organismo vivo, praticante de um jazz no qual o groove é quem mais ordena. Daí a fervura que levantaram e a segurança com que evoluíram, a evidenciar algumas notas importantes, de que destacam a fluência discursiva e a gana com que atiraram ao trabalho, sem hesitações nem engasgamentos; o notável sentido de tempo e de oportunidade de ataque e retirada; as excelentes trocas de informação e instigação recíproca sobre inesperadas mudanças de tempo; a naturalidade com que incorporaram, processaram e devolveram marcas e memórias de vários géneros musicais – o LLHQ é um ser omnívoro que pratica uma dieta rica em vitaminas que lhe vêm do rock, dos blues e do jazz, influências que o grupo transcende –; e, finalmente, o som cru e intencionalmente “sujo”, de belo efeito estético e irresistível apelo.
Partindo das estruturas escritas por Luís Lopes – um naipe de boas composições amigas do ouvido – o quarteto assentou o seu programa de improvisação fundamentalmente sobre a base rítmica endiabrada criada pelos manos González, potente propulsor de duas cabeças, ideal para embalar Luís Lopes e deixá-lo soltar o melhor do seu groove moderno e inventivo, ele que na prática se assume como um guitarrista que se quer não guitarrístico na abordagem, e o chamejante Rodrigo Amado, que deu largas à elevada gama tímbrica e potência sonora que extrai do seu instrumento. Entusiasma sentir e perceber como estes músicos se atiram com paixão ao que estão a fazer, rasgam pano sem medo de se atirarem para a frente, com equilíbrio e proporção, inteligência e ousadia ao serviço duma prática musical rica de variações dinâmicas, mudanças de velocidade, drive, potência sonora, improvisação vigorosa, de enorme plasticidade no seu conjunto, que fomenta a criatividade free dentro das estruturas e permite ampla liberdade de expressão e de movimentos. Música espumante, naturalmente gaseificada. Sábado 26, o quarteto ataca na ZDB, em Lisboa.
Stefan González, Aaron González e Luís Lopes
(Foto: Cristina Cortez)