Provavelmente decepcionado com o beco sem saída a que o drum'n'bass o havia conduzido, embalado pelo sopro do novo século, o duo britânico Spring Heel Jack (John Coxon/Ashley Wales), coincidindo com a mudança para a editora Thirsty Ear, resolveu em 2004 empreender uma mudança radical nas suas concepções estéticas, e enveredar, para surpresa de muita gente, pela improvisação electro-acústica subsidiária da british improv e do free jazz, actualizando, simultaneamente, procedimentos e estratégias. Depois de dois mais que interessantes discos de estúdio, Masses e Amassed, e um terceiro Live, comprovativo de que nada do que se ouvira antes era simples truque, samplagem mistificadora ou trabalho de maquinaria a funcionar em regime de autogestão, o projecto vingou enquanto quarto capítulo da segunda vida do duo britânico, que, à semelhança das edições anteriores, se faz acompanhar de nomes que integram a nata da improvisação livre actual. Além de Coxon (guitarra, órgão, harmónica, vibrafone, sampler e electrónica) e de Wales (guitarra acústica, trompete, congas, sampler e electrónica), desta vez a companhia incluiu o trompetista norte-americano Wadada Leo Smith, homem de muitas vanguardas; o reincidente Evan Parker (Wadada e Parker juntos!), e, outra novidade relativamente aos episódios anteriores, a mui requisitada "secção rítmica" das ilhas britânicas, John Edwards e Mark Sanders. Musicalmente, The Sweetness of the Water é o mais depurado e menos saturado dos quatro discos. A música de Coxon & Wales, permanecendo embora fiel aos termos da improvisação electroacústica, ganhou mais espaço, orientada para ambientes nocturnos, melancólicos e meditativos. Guitarras e electrónica fundem-se com saxofones, trompete, contrabaixo e bateria numa suite minimalista de passada lenta, quase sussurrada, alegoria de paisagens urbanas fora de horas. Janela que se abre sobre a rua deserta depois do regresso a casa. O reencontro com a quietude das coisas que vivem na peúmbra. Surpreendente, The Sweetness of the Water, o mais romântico dos discos do Spring Heel Jack, é um bom exemplo do que de melhor se tem feito na área da improvisação electroacústica, capaz de romper com algumas convenções do género.