Bela surpresa me guardava a audição de Logique du Désordre, disco que me chegou há dias pela mão de Laurent Peter, do grupo Diatribes. É este o trio do electronicista d'Incise (Laurent Peter), do saxofonista Gaël Riondel (também em clarinete e flautas) e do baterista e percussionista Cyril Bondi. Aumentado com a participação de dois outros músicos suíços, Christian Graf (guitarra) e Nicolas Sordet (cordofones electrónicos), em dois dos seis temas do disco, gravado ao vivo na Cave de l'AMR (foto infra), em Genève, Suíça, entre 1 e 3 de Novembro de 2005. Depois de uma bem sucedida série de EPs e LPs editados em netlabels europeias (entre elas, a portuguesa test tube, Parenthèse Polonaise), eis que o Diatribes se estreia em formato CD na suíça Altrisuoni. Diatribes, sabe quem já ouviu, pratica a arte da improvisação livre, uma actividade que, são sendo um género em si mesmo (ok, também assim se poderá considerar, mas adivinho não ser essa a preocupação dos músicos), incorpora em si mesma distintivos de outros géneros e subgéneros, neste caso, do jazz de tendência libertária, da música "contemporânea", da electroacústica e do noise electrónico, assim criando, mais que uma forma personalizada de usar a dita técnica, uma linguagem musical transgressora dos cânones em voga, algo que se materializa e desvanece passo a passo até à recombinação seguinte.
Atravessada por uma poética nocturna e melancólica, que convive bem com ambientes soturnos, a música de Diatribes inquieta mais do que tranquiliza. Insinua-se por entre paisagens que se julgavam conhecidas e familiares, revelando olhares insuspeitos sobre a complexa realidade cénica que se depara diante do ouvinte. Perturbantes são também os sons que aqui se cruzam, ora frios e cortantes como lâminas, ora quentes e ricos em miragens (ouçam-se os fragmentos de melodias que se desprendem das ondas electroacústicas) como as areias do deserto.
Empatia, coesão, fluidez discursiva e bom gosto na combinação instrumental com que se explora a variada paleta de timbres e texturas, tornam Logique du Désordre numa obra de elevado valor estético e proveito auditivo. Improvisação moderna swiss made. Não é certa como um relógio (mesmo que, como adianta o título, haja uma lógica interna nesta desordem aparente), nem doce como chocolate, mas funciona e deixa duradoura impressão. Recomendável? A todos os títulos.
Diatribes ao vivo. Cave de l'AMR