O dispositivo pelo qual Wade Matthews optou em Aspirations and Inspirations, conjunto de improvisações a solo realizadas entre os anos de 2002 e 2004, favorece a utilização do silêncio e a atenção ao detalhe na exploração das possibilidades técnicas e emocionais do clarinete baixo e da flauta alto. Na base, estão os dois primeiros actos que todos praticamos, inspirar e expirar, o que imediatamente nos remete para matérias relacionadas com o sopro vital. E tudo se passa como se a vida se suspendesse entre cada fase e de imediato regressasse à plenitude pela via do som.Ouvi o disco várias vezes sem antes ter lido os créditos, e não fora essa leitura a posteriori ficaria convencido de que boa parte dos sons seriam electronicamente gerados – a grande ilusão, que é também uma das mais interessantes ironias deste disco.
No meio da aparente dispersão, Matthews consegue estabelecer um fio condutor não narrativo, fragmentado, rico em nuances e variações microestruturais, em estreita ligação com outros dispostivos fundamentais na realização da obra: os microfones e o seu particular posicionamento, “multiple mics panned across the stereo spectrum”, que captam toda a acção dentro e fora da flauta, aumentando assim o potencial expressivo do instrumento.
Além da ausência de traços de convencionalismo e do trabalho microscópico que, a traço grosso, caracteriza a idiossincrasia de Wade Matthews, em Aspirations and Inspirations é possível admirar o virtuosismo do soprador, posto não ao serviço da potência sonora ou da exibição de capacidade pulmonar – marcas que decididamente não se inscrevem no seu estilo – e sobretudo, o controle sobre os sons e a maneira como se combinam, de tal forma que cada vez que se ouve Aspirations and Inspirations (Solo Improvisations 2002/2004), parece tratar-se de um disco diferente.
Delicado no toque, vagaroso e afirmativo, Aspirations and Inspirations situa-se no vasto espaço de exploração das infindáveis potencialidades dos instrumentos acústicos, associadas ao papel da alta tecnologia na captação e mediação sonora. Matthews, mercê de uma individualidade difícil de aprisionar em escolas ou estilos definidos, afirma-se através do modo peculiar e personalizado como trabalha a matéria‑prima sonora.