Strong Language é um discaço! Lunge, o quarteto, nasceu na sequência da participação dos seus membros na digressão que Butch Morris realizou em Londres em 1997, a London Skycraper Tour. Gail Brand, trombone, chefia o mesmo quarteto que gravou Brace & Framed para a Acta. Phil Durrant, electrónica e violino, Pat Thomas, electrónica e piano, e Mark Sanders, percussão. Improvisação electroacústica da escola britânica, que explora intensamente as possibilidades tímbricas dos instrumentos acústicos, combinando-os com as texturas suaves e discretas da electrónica. A música foi gravada em concerto no Bimhuis de Amesterdão, em 2002, no âmbito do dOek Festival #2. Para completar o disco, o produtor Martin Davidon acrescentou duas outras peças gravadas no Gateway Studio, em Londres, dois anos antes. Abre-se a sessão com Planarchy. Em bom passo, Gail and the boys estabelecem desde o início o paradigma sonoro para o tempo e o modo que se vai seguir: imprevisíveis cruzamentos instrumentais, desdobramentos em ligações laterais e diagonais que disparam em todas as direcções, trombone/percussão, electrónica/percussão, electrónica/trombone, violino/piano… .
Sons microscópicos misturam-se sem pré-aviso, mutações orgânicas sucedem-se de modo imprevisto.
Rough With the Smooth desenvolve-se no tom soturno que mais adiante se irá encontrar em Rothko. Acentua-se a contemplação introspectiva com os sons graves do trombone, sobrepostos ao contínuo fervilhar de partículas sonoras em lume brando. Um ouvido treinado e atento ao detalhe beneficiará ainda mais com audições sucessivas deste tema, um dos melhores da sequência.
White Writeable Area começa com sinais esparsos de electrónica, pontuados pela subtil assimetria rítmica das escovas de Sanders. Pequenas bolhas de ruído electrónico enchem e rebentam como acidentes na paisagem que se vai progressivamente adensando. Violino e piano percutem repetida e desencontradamente, gerando o ambiente dramático ideal para se ouvir a lassidão fibrosa do trombone, que corta a bruma e soa quente por cima da base electrónica.
No Filters, sendo curta (4'10), é a peça mais vivaz do conjunto. E também a que mais se aproxima do jazz. Gail Brand toca um conjunto de frases melódicas num estilo próximo do George Lewis. Pat Thomas, sublinha algumas passagens ao piano. Sanders, frenético, inventa o seu próprio swing, e Phil Durrant preenche boa parte dos espaços deixados em branco com pinceladas de electrónica low-fi, que por vezes lembram as vocalizações de Phil Minton.
Virada a página do concerto de Amesterdão, Mull it Over, primeiro dos temas de estúdio, sendo anterior em data à sessão holandesa, evidencia o mesmo tipo de estratégia. Gail Brand usa agora a surdina e uma série de utensílios e técnicas de modelação sonora, aqui mais próxima da estética de Paul Rutherford. Em fundo evolui a bug music do trio Durrant/Thomas/Sanders. Vejo Gail sentada à sombra de uma árvore carregada de pássaros, cigarras e outros insectos, improvisando no trombone ao entardecer de um dia de verão.
Rothko, a fechar a sessão, inicia-se com Sanders e Durrant em primeiro plano, a arranhar pratos e cordas. Soam ecos de trombone, primeiro ao longe, depois mais próximo da boca de cena, invertendo-se as posições relativas entre voz principal e trio. Sobre o cenário desce o tom de melancolia outonal com que se conclui a jornada.
Lunge - Strong Language (Emanem)