Jacques Demierre (n. 1954), pianista e improvisador suíço, mantém desde há anos uma actividade regular como colaborador de músicos da mesma e numerosa família europeia, norte-americana e japonesa, a par do trabalho regular sobre o piano solo. Se, quanto à primeira faceta, abundam os exemplos de actividade partilhada (ouçam-se, a título ilustrativo e sem intenção de esgotar o assunto, os discos publicados pela suiça Intakt Records, com Barry Guy, Lucas Niggli, Sylvie Courvoisier, Hans Koch, Martin Schütz, Fredy Studer, Andreas Marti e Stephan Wittwer), a abordagem individual do piano, ainda que frequente, tem sido menos documentada. No campo da intervenção individual, a netlabel Insubordinations publicou em 2006 Black/White Memories, cuja audição se recomenda. Preenchendo esta “lacuna”, saiu recentemente na Creative Sources Recordings um volume de Demierre exclusivamente em piano solo, sessão gravada em Abril de 2007, num estúdio de Berlim. One is Land, inspirado no minimalismo abstracto de Robert Lax, é composto por duas peças de longa duração (Sea Smell, 23’20; e Land Smell, 19’46), ambas estruturadas como sequências de notas, com intervalos mínimos, quase imperceptíveis. Na primeira, Demierre cria blocos de notas percutidas, estruturados em fiadas contínuas, fragmentadas e irregulares, de cor e intensidade variáveis, que emprega no acto de transformar o piano numa orquestra percussiva de muitos timbres. Na segunda, complementar e contrastante no uso que faz do piano preparado, Demierre favorece o trabalho dentro e fora do instrumento, agora sem o ataque denso e cerrado da primeira parte. Neste aspecto, Land Smell é todo delicadeza minimal, silêncio e suspensão, espécie de bailado microscópico que privilegia a contenção à exuberância sobrecarregada de energia cinética de Sea Smell, por via do macio afagamento das cordas. Da combinação das duas partes resulta um conjunto de belo efeito, que se vai descobrindo nos seus infindáveis pormenores a cada nova audição.