Estreia em disco do duo PRAED, do suíçoPaed Conca (baixo eléctrico, clarinete e electrónica) e do libanês Raed Yassin (contrabaixo, rádio, fita magnética e electrónica). Em The Muesli Man (Creative Sources Recordings # 120) fabricação sonora a quatro mãos fornece interessantes combinações e perspectivas de entender a arte sonora no presente imediato e de perspectivar o desenho do que no futuro se pretende explorar. Musicalmente, o duo devolve-nos um olhar sofrido e irónico sobre o mundo interior e exterior (The Muesli Man…), por via de uma imagética simbólica da violência das sociedades actuais, seja ela emergente das agressões da vida urbana dos dias que correm, seja num contexto de terror e de guerra explícita (o Líbano, que também é a terra de Mazen Kerbaj e Sharif Sehnaoui, há décadas que não conhece outro ambiente), cuja brutalidade e insensatez colocam em evidência. Nessa medida, construir, desmanchar, voltar a colocar pedra sobre pedra, é um processo comum ao que se vive no dia-a-dia, no qual o que hoje parece sólido, amanhã cai por terra e tem que ser reconstruído. É dessa mesma precariedade estrutural em permanente mutação (nada se perde, nada se cria, tudo se transforma), que vive a música de Paed Conca e Raed Yassin. PRAED, termo que resulta da aglutinação dos nomes dos artistas, simboliza, em termos práticos, a convergência e a interacção entre som e imagem em directo, com particular enfoque na discussão que mantém através de práticas tradicionais na abordagem dos instrumentos e de novas formas de entender aquele relacionamento, descarnadas e desmontadas a partir de ligações restabelecidas noutros moldes a partir dos fios da memória próxima e distante. A panorâmica beneficia de uma gestão ampla do espaço acústico, no qual os artistas vão colocando os sinais sonoros de forma dinâmica, como actores que em palco representam diferentes papéis, ora afastando-se para dar lugar ao outro, ora sobrepondo o discurso. É deste modus operandi, assente na variedade de estímulos proposta e a assertividade da sua produção em tempo real, que nasce a marca da originalidade da música do PRAED. Ela assenta numa contínua exposição das ideias entre o som natural do clarinete e do contrabaixo e a alteração por via electrónica, desconjuntado e espalhado em fragmentos de novo amalgamados com sons de televisão, rádio, ruídos esparsos com que polvilham as texturas que se vão sobrepondo. Os diversos níveis de leitura que The Muesli Man fomenta começam a tornar-se nítidos a partir da terceira audição.