Há anos que o contrabaixo namora a electrónica. Praticantes felizes tem havido uns quantos, daqueles que têm procurado novas formas de relacionamento entre fontes e materiais sonoros, de modo a potenciar o papel do contrabaixo num contexto electroacústico mais alargado, um campo aberto à improvisação experimental e à consolidação do que de novo se tem vindo a adquirir a partir das várias componentes em que se declinam as relações entre contrabaixo, software e hardware, com resultados diferentes em razão das diversas concepções, processos e intenções de cada improvisador. Estou-me a lembrar de músicos como Mark Dresser, Barry Guy ou Lisle Ellis (excelente entrevista no número último da Cadence Magazine (Jan/Fev/Mar 2008), importante para se perceber estas relações, além do seu posicionamento nos últimos 30 anos, no Canadá natal e nas costas Oeste e Este dos EUA). Ao nível dos processos e das ligações que procura estabelecer, Lisle Ellis, por exemplo, criou um sistema inspirado no sistema nervoso do corpo humano, que procura mimetizar as passagens de sinais e impulsos químicos e eléctricos entre os neurónios. O mesmo tipo de relação que se passa entre corpo e mente despertou a curiosidade criativa de outro grande contrabaixista da actualidade. Falo do francês Bruno Chevillon, também ele interessado em investigar as relações entre o contrabaixo e os circuitos electrónicos. Assumidamente virado para os aspectos experimentais daquele cruzamento, Chevillon editou em 2007 o seu primeiro disco a solo, Hors-Champ, na editora D'Autres Cordes. A produção é de Franck Vigroux, que também colabora com os dois textos que a artista alemã Antye Greie-Fuchs (AGF) diz, de modo sussurrante, nas peças Dans Sa Tete Abaissee e Germania. Todos os 11 temas são pintados com texturas escuras e rugosas, que formam um magma sonoro complexo, matéria-prima que o contrabaixista trabalha e manipula. Entre o electro-noise e o near silence, Bruno Chevillon trabalha as suas esculturas num espectro sonoro extremamente amplo e singular, feito de matizes electrónicos e alongamentos acústicos. Nessa medida, o disco, obra de sensibilidade e inteligência, é um contributo relevante tanto para a história, como para o presente e para o futuro da música improvisada electroacústica, questiona o que já foi feito, instaura avanços estéticos e fixa um novo patamar a partir do qual outras relações e experiências acústicas se poderão entabular.