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28.8.07
 

Uma das referências que salta imediatamente à vista no trabalho de Rafael Toral é que se trata da obra de alguém que tem um programa, isto é, que pensa e organiza a sua actividade de artista sonoro segundo determinadas coordenadas de tempo e espaço previamente definidas. Para compreender este postulado bastaria estar atento ao percurso que tem vindo a realizar, que recentemente empreendeu uma nova direcção com o Space Program, a mais recente proposta do músico, pensada para uma década de trabalho sobre o som nas suas relações com o espaço multidimensional. Este no ciclo teve início com o lançamento de Space (Staubgold), disco com que se encerrou o estádio precedente, o da criação por via de uma investigação a fundo sobre as possibilidades da guitarra eléctrica e do drone electrónico. Space Solo 1 (Quecksilber), segundo capítulo do Space Program, é também o primeiro volume de uma série pensada para editar nos próximos anos, até 2012, a repartir por uma dezena de discos, numa sequência que Rafael titulou genericamente Solo Series.
Space Solo 1 dividide-se em cinco peças, gravadas em diferentes locais de Lisboa (Studio 4, Galeria ZDB e estúdio Noise Precision) entre 2005 e 2006. Os títulos adquirem a denominação do artefacto electrónico que lhes dá corpo em cada caso, aparelhos que Rafael Toral constrói ou adapta às suas ideias e necessidades, de modo a desenhar sons com um recorte personalizado e a criar uma permanente sugestão de movimento. Assim, temos Portable Amplifier, título do primeiro segmento, seguido de Echo-Feed, Bender, Electrode Oscilator, e, a fechar, Portable Amplifier 3 – denominações dos “brinquedos” – é evidente o fascínio de Toral com o bricolage instrumental – com que compõe a sua música, entidade despojada de adereços, sucinta e concentrada na exposição, personalizada no modo de se apresentar. Influências? Notam-se as de alguma da música electrónica vintage que despontou no pós-Guerra, que Toral privilegia sobre a electrónica digital (laptop), ensinamentos teórico-práticos de John Cage e de Alvin Lucier, tal como processos acústicos que evocam diferentes formulações estéticas de investigadores tão diferentes como Jack Wright, John Butcher ou Sei Miguel (que participa em Space), a que não faltam sons que lembram jogos electrónicos japoneses (space invaders) ou o canto de aves robotizadas.
Neste sentido, Space Solo 1, que retoma alguns dos aspectos enunciados em Space, enquanto quadro de referência, ponto de partida e de chegada, apresenta-se simultaneamente como desenvolvimento e condensação do trabalho anterior, no modo como exprime uma relação íntima e intrínseca com a acção corporal. Assistir a uma actuação ao vivo de Rafael Toral é, por isso, uma experiência sensorial alargada, graças à utilização de efeitos visuais, como por exemplo, luvas especialmente concebidas para pôr em movimento sons e efeitos luminosos em sincronia. A música de Space Solo 1 é toda criada em tempo real, num único instrumento por peça de composição instantânea, segundo processos idênticos aos que por vezes ocorrem na improvisação ligada ao jazz, aquela que procura abrir caminho e que não se limita a repetir fórmulas do passado. O objectivo é comum a ambas as formas de criação: buscar modos únicos e alternativos de expressão artística através do som.

 


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