Passada a metade da sétima década de vida, a actividade criativa de Fred Anderson continua a causar espanto. Ao mesmo tempo que preparou a reabertura do seu mítico espaço de Chicago, o clube Velvet Lounge que dirige há mais de 25 anos, onde serviu ao balcão e tocou saxofone com quem aparecia – e aparecia muita gente para tocar – Fred Anderson permanece febrilmente activo, com o seu inconfundível saxofone tenor, que privilegia registos médios e soa tanto a AACM como ao espírito cultivado por John Coltrane e Pharoah Sanders. Retomado o convívio com os antigos companheiros de lide, Fred Anderson gravou este ano From the River to the Ocean, provavelmente o disco mais eclético e estilisticamente diversificado que se lhe conhece, bem dentro do espírito mais genuíno da escola AACM. Dela emergiram sucessivas gerações de músicos, como é o caso do baterista Hamid Drake, com quem Anderson mantém uma relação musical há 30 anos, e de novo assume o papel de co-autor. Isto porque o disco é essencialmente fruto da profícua colaboração entre os outrora mestre e pupilo, e emerge da plena comunicação espiritual entre os dois criadores – magnífica ponte entre gerações –, a que se soma o imenso talento do contrabaixista Harrison Bankhead (8 Bold Souls, Frequency, também em piano e violoncelo), do guitarrista Jeff Parker (Chicago Underground, Tortoise e Isotope 217), e do contrabaixista Josh Abrams (Town and Country, Sticks and Stones, Prefuse 73). From the River to the Ocean, disco consistente e bem construído, apela às coisas do espírito, com uma atmosfera de serenidade contemplativa, temperada de blues profunda e intensamente vividos, e influências afro-orientais. Jazz, swing, groove, bop, free e world em recriação inventiva, que liga o momento presente, a tradição e o devir numa linha de continuidade sem fim à vista. From the River to the Ocean irá certamente marcar esta época. Para já, conta-se entre os melhores de 2007. Edição da Thrill Jockey, com distribuição lusa pela Dwitza.