A música de Doctor Bob, a princípio, é literalmente intragável. Pode-se ficar por aqui, arrumar Dark Times na prateleira mais inacessível e passar adiante. Porém, há algo que realmente incomoda nesta música. Para começar, este é um ponto a favor. Tomara que a maior parte da música que hoje se faz tivesse este poder de incomodar o ouvinte, de o inquietar. É este o clique que espicaça a curiosidade, a vontade de regressar ao momento da desolação inicial e tentar perceber o que é que provoca tal desconforto. Do pior sentido do termo passa-se a uma acepção bem mais positiva, se se lhe der novas oportunidades de audição. Fazendo jus ao título, o ambiente de Dark Times é soturno, melancólico, sinistro até. A voz processada de Bob Marsh arrepia por cima da hostil mistura de sons de violoncelo eléctrico com a lap steel guitar de David Michalak, formando um processo contínuo de sinais sonoros da mais inusitada extracção. Com tempo e um pequeno esforço de aproximação e de concentração, uma vez imerso no som, chega a ser divertido ouvir todo este non sense, que, bem vistas as coisas, faz todo o sentido, enquanto banda sonora de um pesadelo. E a coisa funciona razoavelmente bem: as paisagens surreais, desfocadas, de cores escuras, correspondem à intenção programática dos artistas e dão boa conta da finalidade expressa nas notas – a de criar uma ilustração sonora do mundo assustador em que vivemos, onde, apesar das ameaças e do desconserto generalizado, ainda é possível ter esperança. Edgetone Records.