A talentosa Jess Rowland, compositora e improvisadora residente em S. Francisco, Califórnia, desligou por momentos a parafernália electrónica, experimental, noise, jazz e rock do costume. Pelas minhas contas, à quinta vez a solo (não posso garantir a veracidade deste facto), resolveu virar-se de corpo e alma para a delicadeza acústica do piano, segundo as regras taoistas da busca da verdade e da autenticidade em cada momento do ser e do estar. De ouvido encostado à fina respiração sonora, percebe-se que cada peça conta uma história. Cada história liga-se por laços invisíveis à precedente e à seguinte, fechando ciclo após ciclo, como um conjunto de painéis. Sente-se o prazer que Jess Rowland tem em contar histórias. Nasce da concentração no que é essencial, procurando fixar identidades próprias e alheias – uma multiplicidade de vozes, sujeitos e objectos animados. Arte despojada e radical, no sentido do encontro com a raiz, que tanto pode ser a do ouvinte como a da própria música. No entanto, a aparente simplicidade exterior, ingénua e até infantil no modo de dizer, esconde uma complexa estruturação, que melhor consolida e agrega os fios narrativos desta colecção de improvisações. A música é água que corre, turva ou cristalina, vencendo todos os acidentes de percurso, imparável, como em Cecil Taylor.
Há coisas (fantásticas, não há?) que acontecem por indeterminação, sem serem casuais. Fios de destino que se compõem, decompõem e recompõem num ciclo interminável, do qual nos é dado experimentar fragmentos. Como este 29.Water - Piano Improvisations (Pax Recordings).