Alípio C Neto (saxofone tenor, flautas e apitos) e Jean-Marc Charmier (trompete, fluegelhorn e pocket trumpet) convidaram os suecos Torbjörn Zetterberg (contrabaixo) e Joakim Rolandson (saxofone alto e flauta), e o baterista português Paulo Bandeira para uma sessão de estúdio em Lisboa, com o técnico de som Luís Delgado. Foi na tarde de 15 de Julho passado. Assistiram a tudo o artista gráfico Lizuarte Borges e eu próprio.
Em cinco temas, todos gravados num único take, o quinteto deixou pronta uma rough mix que ando há dias a ouvir. Dos cinco temas, três são de Alípio (Pajeú, Aboio 1 e Violet Furs) e dois de Jean-Marc (Fujiamor e Une Rose Rouge), composições que o grupo atacou sem ensaio e sem que antes os músicos tivessem tocado juntos. Fácil foi a comunicação e a empatia que espontaneamente se estabeleceu entre cinco pessoas com percursos e vivências muito diversificadas, característica que se converteu em enriquecimento musical.
Ambos membros do iMi Kollektief e de uma série de outros grupos passados e presentes, Alípio e Jean-Marc conhecem-se bem, longa foi a década em que tocaram juntos na rua e debaixo de telha. Representam duas maneiras de ser e estar que se complementam e prolongam musicalmente, que vivem no encontro e no cruzamento das linhas contrapontísticas, um mais agreste e anguloso, o outro mais suave e melódico.
Interesse acrescido viria do lado de Torbjörn Zetterberg e de Joakim Rolandson, dois jovens músicos do novo jazz sueco, à data em excursão surfista por Portugal. Joakim com um saxofone alto marcadamente ornettiano, a que não falta um toque de Coltrane nos registos mais graves, e Torbjörn com Mingus a correr-lhe nas cordas, tocaram com a garra que se lhes conhece de anteriores trabalhos em disco, que por isso mesmo deixava antever boas parcerias. Paulo Bandeira, músico mais associado à prática do jazz mainstream, mostrou ser versátil e ter capacidade de se adaptar aos vários estilos. Formou sólida dupla rítmica com Zetterberg, impulsionando o trio de sopros de modo a fazê-lo colocar sempre mais ardor na tarefa.
Fruto de uma bela sessão, equilibrado nas proporções, o disco tem potencial para agradar tanto aos cultores de um jazz mais arrojado e exploratório, em que os solistas pulam a cerca e acabam por regressar ao redil, como aos apreciadores da improvisação estruturada dentro dos temas, com uma variedade considerável de moods, cores e ritmos ao longo de 50 minutos de denodada entrega à causa.
Depois de masterizado, rua! Porque esta música merece ser ouvida.